A Polícia Militar não deixou o MPL protestar

Policiais detendo um manifestante com truculência.

Depois de muitos anos cobrindo protestos de rua pela cidade de São Paulo, na última quarta (16), pude acompanhar o ato do Movimento Passe Livre (MPL) evaporar da Avenida Paulista, na cidade de São Paulo, de um ângulo diferente: do décimo andar de um prédio onde fica a redação da VICE.

E o que vi não foi muito diferente do que presencio nas ruas desde as Jornadas de Junho de 2013: a Polícia Militar, agora sob a batuta do governador João Doria (PSDB), reprimindo violentamente uma manifestação que sequer teve a oportunidade de começar.

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Entre o show de bizarrices cometidas pelos policiais, estavam as violentas prisões para averiguação, a truculência com jornalistas e fotógrafos que acabaram feridos por tiros de bala de borracha à queima-roupa e, como sempre, o total despreparo para lidar com uma manifestação de rua com pautas de esquerda. Porque, sim, precisamos reforçar que os protestos de esquerda recebem tratamento diferente da Polícia Militar.

Ferido na perna por um tiro de bala de borracha, o fotojornalista da Ponte Jornalismo Daniel Arroyo disse à VICE: “Tinha bastante policial, mas a postura é mais importante que o número. A postura estava bem violenta, fazia tempo que eu não via aquele tipo de abordagem. Foi completamente desproporcional. Ninguém entendia qual era o motivo das abordagens”.

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A perna do fotojornalista Daniel Arroyo, da Ponte Jornalismo, ferida por bala de borracha. Foto: Rogerio de Santis/VICE

Arroyo se dirigiu ao comandante da polícia para explicar que estava fazendo seu trabalho quando foi atingido. Em vídeo, vemos o que os policiais fazem: nada. Absolutamente nada.

Do alto do prédio, vi inúmeros jornalistas e fotógrafos batendo boca com PMs que os empurravam e ameaçavam mesmo que estivessem devidamente identificados. Arroyo confirma o acontecido. “Eles estavam indo pra cima dos jornalistas.”

Nem mesmo os tais policiais mediadores de colete azul – uma tática de João Doria para fazer parecer que sua polícia está disposta ao diálogo – tem dado certo. O primeiro ato, que aconteceu no dia 11 de janeiro, foi uma vergonha pro poder público, como noticiamos por aqui. Os mediadores nada mediaram e o clima de tensão se estendeu durante todo o ato. Vale dizer que, quando se trata de um protesto de esquerda, a Polícia Militar do Estado de São Paulo gosta muito de decidir qual trajeto pode ser feito pelos manifestantes – e isso não existe.

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A Polícia Militar detendo manifestantes durante o ato. Foto: Rogerio de Santis/VICE

De acordo com o artigo 5º do inciso XVI da Constituição, “todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente”. Portanto, decidir o trajeto que a manifestação pode ou não pode fazer não é papel da polícia ou da Secretaria de Segurança Pública. Não há nada na lei que garanta que o fluxo do trânsito de uma megalópole é mais importante do que o direito de protestar. Muitas vezes, o imbróglio causado na hora da negociação do trajeto é o que exalta os ânimos e, daí para um empurra-empurra que termina com bomba de gás lacrimogêneo basta um segundo.

Enquanto o MPL conduzia um jogral antes de o ato caminhar, é possível ver num vídeo publicado pela CSP – Conlutas que um policial tenta deter um sujeito de camiseta amarela e balaclava que acaba escapando. Nisso, bombas começam a explodir e as pessoas passam a correr. E aí começou toda a violência dos policiais.

É injustificável que, por conta de uma, duas ou três pessoas que estejam agindo de má fé ou portando materiais indevidos numa manifestação pacífica, a polícia repreenda todos os presentes e impeça que as pessoas exerçam seus direitos.

O uso progressivo da força é uma piada quando falamos da Polícia Militar de São Paulo. Além de tudo, ele é absolutamente desproporcional.

Não levou cinco minutos para que os manifestantes se dispersassem, esvaziando o protesto. Algumas pessoas retornaram ao ponto de partida e conseguiram finalizar o ato em frente à Praça Roosevelt. Segundo a polícia, 12 pessoas que continuaram na via foram detidas. Já o MPL publicou posteriormente que, dessas 12, três passariam por audiência de custódia e as restantes seriam liberadas.

O próximo ato contra o aumento da tarifa já está marcado: será no dia 22 de janeiro, na Praça da Sé. Basta saber se a violência policial não irá esvaziá-lo antes mesmo de começar.

Colaboraram Amanda Cavalcanti e Marcos Fantini

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