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A Sombra Avassaladora do Flappy Bird

Nos últimos dias, o mundo pareceu estar dividido entre dois tipos de pessoas, as que ODEIAM Flappy Bird e as que AMAM ODIAR Flappy Bird. Se você vive dentro de uma bolha e não sabe do que se trata, o Flappy Bird é um jogo desenvolvido por Dong Nguyen, um vietnamita de 29 anos. Trata-se de um joguinho casual feito especialmente para Android e iOS no qual você controla um pássaro (que mais se parece com um peixe roubado do Super Mario World) e o único controle que você tem, tratando-se de um endless runner, é dar uma cutucada na tela do seu smartphone para o passarinho subir um pouco na tela evitando que ele caia tela abaixo como o pedaço de ave mais denso do universo causando um imediato Game Over. Mas o que esse joguinho despretensioso — que, de fato, ele é — fez para merecer tanta atenção dos internautas e tanto ódio de tudo o que anda e respira? Vamos analisar alguns aspectos do jogo, de sua recepção pelo público em geral e da crítica pelas pessoas que levam videogames a sério para tentar encontrar alguns padrões que já aconteceram e certamente irão se repetir em um futuro bem próximo ou meio distante no mundo dos videojogos.

Flappy Bird é um jogo feito nas coxas em um período de três dias e que, do nada, fez sucesso mundial e foi baixado por cerca de 50 milhões de usuários; um jogo que, apesar de a principio ter um gráfico pixelado simpático, logo perde o charme por usar conteúdo chupinhado do Super Mario World. É um jogo que deve grande parte do atrativo de sua jogabilidade ao nível elevado de dificuldade, que pode muito bem ter ocorrido por causa de uma escolha consciente de design tanto quanto pode ter ocorrido apenas pela má programação. Que crimes esse vietnamita cometeu contra a humanidade para disseminar o ódio de todos que voltaram seus olhos para seu joguinho feito nas coxas? Aparentemente, vários, mas já sigo com a tese de um principal.


Dong Nguyen e o fantasma do Flappy Bird.

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Não é a inveja pelo jogo ter tido por volta de 50 milhões de downloads, não é pelo fato de o desenvolvedor do jogo, quando ele estava disponível, estar ganhando estimadamente 50 mil dólares por dia, não é pelo fato de todo mundo agora saber quem é esse jovem vietnamita e de você achar que existem jogos que seria mais JUSTO se tivessem esse tipo de sucesso. Ajudando, assim, por meio dessa justiça digital, uma complicada ideia de progresso no mundo dos videojogos e, por que não?, dos jogadores e de um mundo melhor para todos nós. O problema é que as pessoas que manjam de games ficam muito putas por não entenderem o que faz um jogo, que em princípio não tem nada de especial, fazer tanto sucesso. Foi o que rolou com o Candy Crush, foi o que rolou com o Farmville e é o que vai rolar com algum outro jogo casual que porventura venha a fazer um sucesso estrondoso num futuro próximo. Eu entendo a angústia de não entender o que passa na cabeça das pessoas para dar tanta moral a um jogo que, no final das contas, nem é tão especial assim. Francamente, eu acho meio injusto que empresas como a PopCap Games que fazem ótimos jogos casuais não faça tanto sucesso quanto esses cometas esporádicos, mas, quer saber, foda-se. Os caras da PopCap definitivamente não estão mal das pernas e, no final das contas, tanto faz como a grande massa da humanidade se sente em relação a tal ou qual jogo de videogame. Não interessa se estão gostando do jogo por motivos que você considera ERRADOS, o que interessa é que estão gostando do jogo e pronto. Muita gente fica puta porque não entende o porquê ou simplesmente porque isso não encaixa em seus modelos de visão de mundo.

Outro ponto curioso que tem sido alvo de crítica ao pobre vietnamita é que as pessoas estão inventando muita história para justificar o motivo de ele retirar o jogo do ar, ainda mais com seu faturamento de 50 mil paus (dólares) por dia. Algumas acusações foram feitas sobre ele estar se cagando de medo que a Nintendo possa processá-lo por causa das gritantes semelhanças dos sprites do jogo com alguns do Super Mario World, inclusive, a Nintendo respondeu prontamente que não entrou em contato com Dong pedindo que ele tirasse coisa nenhuma do ar. O fato de ele ter tirado o jogo das lojas deixou a galera mais puta ainda não só por ter tirado o joguinho preferido delas de circulação, mas também veio aquela onda de, “Nossa, que cara babaca, ele tava ganhando muita grana por dia, nossa, que otário”, como se a conquista material, mesmo vinda de uma fonte de sofrimento pessoal, sempre se justificasse. Dong Nguyen, em entrevista concedida à Forbes, disse que tirou o jogo do ar porque ele era “viciante demais” e ele acha que isso estava fazendo mal às pessoas, não sei se foi uma explicação satisfatória. Para mim, a explicação mais razoável, no final das contas, é a do medo dessa reação exacerbada que as pessoas assumem em suas personas de internet. Dong Nguyen, nas últimas semanas, deve ter se sentido a pessoa mais sozinha do mundo por ter feito um sucesso inesperado, que provavelmente não acha que mereceu e certamente não estava pronto para aguentar isso tudo. Do dia pra noite, esse sujeito foi exposto ao extremo para milhões de pessoas ao redor do mundo, do louvor cego ao ódio apoplético, o que não me soa saudável em nenhuma situação. Além disso, tudo o que ele fizer daqui para frente, para o reso de sua vida, será enxergado sob a sombra avassaladora de um pássaro pixelado.

Enquanto o FlappyMMO estava on-line, um Flappy Bird no qual você acompanha centenas de pessoas através do mundo jogando simultaneamente a você, aproveitei para fazer esse video dando o tom adequado à imersão épica que ele proporciona.

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