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A vida e as imagens do astrofotógrafo brasileiro publicado na NASA

O engenheiro e astrofotógrafo paulista Rafael Defavari, 30, ficou decepcionado quando viu Júpiter pela primeira vez. “É só isso?”, questionou enquanto olhava uma discreta esfera avermelhada através das lentes de um telescópio meia-boca que havia adquirido em loja de departamento. “Comprei errado, como todo mundo faz”, conta.

Ainda assim, não desistiu do hobby. Vendeu o instrumento e, depois de várias pesquisas, comprou outro mais robusto. Foi preciso treino, estudo, hacks e muitas técnicas para que, enfim, visse pelas lentes a magia do maior planeta do Sistema Solar. Durante as novas tentativas, Rafael fotografou com tanta precisão que captou até a sombra de uma das Luas de Júpiter. Sem muita pretensão, enviou as imagens para um fórum e, pouco depois, viu a NASA publicar suas imagens no site oficial. Assim, meio sem querer, o passatempo virou trampo reconhecido mundo afora.

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Rafael mostra o software Stellarium. Crédito: Felipe Larozza/ VICE

Engenheiro durante o dia, Rafael fotografa desde 2010 planetas, galáxias, nebulosas e constelações ao cair da noite. Ex-aluno da Unicamp, foi na faculdade que começou a observar o céu. Depois de participar de um evento organizado por um grupo de astronomia da universidade, veio a vontade de registrar a vista. Com ajuda de fóruns na internet, aprendeu a montar o sistema para fotografar. “Comecei a ver pessoas postarem fotos do espaço e quis aprender”, diz. Uma das suas referências é o trabalho do inglês Damian Peach, que também é engenheiro e fotografa planetas desde os anos 90.

Pela internet, Rafael aprendeu que precisava, em primeiro lugar, de um equipamento básico de fotografia: câmera e tripé. A câmera que ele usa é uma 5D da Canon, mas ele jura que dá pra fazer fotos planetárias até mesmo com uma webcam e que existem algumas marcas especializadas nisso. O importante é que a câmera seja capaz de fazer longas exposições e usar o telescópio como lente.

Rastro das estrelas durante 40 minutos, Visconde de Mauá (RJ). Crédito: Rafael Defavari

Além do equipamento básico de fotografia e do telescópio, Rafael descobriu que precisava de um rastreador para acompanhar o sutil movimento dos corpos celestes. Como esse tipo de coisa é difícil de se achar pronta, ele resolveu aplicar seus conhecimentos de engenharia mecânica e fazer seu próprio GPS de estrelas. Durante seu trabalho de conclusão de curso, meteu a mão na massa e construiu com alumínio sua plataforma de rastreamento, feita com um motor de passo.

A plataforma funciona por causa de uma bateria que dura uma noite inteira. Essa longa duração é importante porque é o tempo necessário para capturar uma boa imagem. Além dos equipamentos, diz Rafael, é preciso paciência para clicar estrelas. A montagem do tripé, da plataforma, da câmera e do telescópio contabiliza pelo menos meia hora de brincadeira. Depois, é preciso fazer o que o astrofotógrafos chamam de alinhamento. “É um processo pra fazer com que o motor do telescópio consiga rastrear o seu planeta ou a sua nebulosa. Isso leva entre uma e duas horas pra fazer direito”, explica.

O GPS de estrelas feito pelo Rafael. Crédito: Felipe Larozza/ VICE

Depois que a plataforma é ligada e o telescópio é alinhado, Rafael começa a fotografar de verdade. Uma fotografia de céu profundo requer horas de exposição. “Depende da claridade do objeto, alguns levam uma hora ou duas para fotografar, mas tem outros que levam cinco, seis horas, porque a luz que chega é muito fraquinha”, diz. Além disso, não é em todo lugar que se consegue fazer uma foto do espaço por causa da chamada poluição luminosa. “Lugares afastados de grandes centros urbanos e secos são os melhores”, indica.

Em sua memória, o céu do Vale da Lua, no deserto do Atacama, no Chile, é um dos melhores para fotografar. Em 2014, ele fez na região uma foto da Via Láctea e de duas das principais galáxias próximas, a Pequena e a Grande Nuvem de Magalhães. Foi uma imagem “completamente despretensiosa”, diz, e que acabou sendo publicada no site da NASA. Aquela foi feita sem o telescópio, mas com uma boa lente.

Via Láctea sobre o Vale da Lua, Atacama, Chile. Crédito: Rafael Defavari

“A gente sabe muito pouco sobre o espaço, eu tiro fotos do desconhecido e tento aproximar para o nosso plano.”

Aqui do Brasil, Rafael fez outras duas fotos que também foram publicadas pela agência espacial americana. Uma imagem de Saturno e suas seis luas – relatada no começo do texto –, vista de São Bernardo, sua cidade natal e onde tem um telescópio maior e mais pesado para captar planetas, e outra da região de Rho Ophiuchi, uma estrela da constelação Ophiuchus, feita em São Bento do Sapucaí, interior de São Paulo. Para esta, ele usou o telescópio e foi preciso de mais horas de exposição.

Saturno e seis das suas principais luas, São Bernardo do Campo (SP). Crédito: Rafael Defavari

Rafael também fotografa muitas nebulosas e galáxias de Campinas, onde trabalha no Sirius, o acelerador de partículas brasileiro do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS). Em termos de técnica, o que ele faz é registrar um vídeo do corpo celeste e empilhar as imagens para formar uma foto. “A hora em que você registra um vídeo, se você usar uma ampliação muito alta, você vê um planeta dançando, você vê ele ora borrado, ora nítido”, diz. “Então você pega esse filme com cinco mil quadros, por exemplo, que você registrou, e passa também programas especiais, que vão filtrar os quadros mais nítidos e fazer esse empilhamento.” É dessa forma, conta, que ele consegue registrar com tanta precisão e clareza as minúcias do espaço.

Galáxia de Andromeda, Campinas(SP). Crédito: Rafael Defavari

Para o Rafael, Saturno, Júpiter e Marte são os planetas mais bonitos por causa dos anéis, luas e da riqueza de detalhes. A galáxia de Andrômeda, afirma, é a mais fotogênica de todas. “Você consegue ver ela a olho nu, dependendo do céu que você vai, você consegue ver os braços dela e o núcleo muito bem”, conta. O mesmo vale para a nebulosa de Oreon, diz ele.

Mas como ele consegue saber onde está cada estrela?

Há muito tempo que o homem olha para o céu e se orienta pelas estrelas e constelações. Mas o homem moderno tem um empurrãozinho da tecnologia. Rafael usa um software livre chamado Stellarium, um mapa interativo do espaço, para ajudá-lo a guiar o seu próprio GPS de estrelas e saber para onde apontar sua câmera. De tanto olhar na tela, algumas coordenadas ele já decorou. Poder encontrar por si, conta, é sempre fantástico. “A gente sabe muito pouco sobre o espaço, eu tiro fotos do desconhecido e tento aproximar para o nosso plano. Olhar pra esse tipo de foto põe a gente pra pensar sobre a nossa posição no universo.”

Confira mais imagens das viagens do Rafael pelo universo:


Jupiter e suas luas, Io e Ganimedes, São Bernardo do Campo (SP). Crédito: Rafael Defavari

Lua, São Bernardo do Campo (SP). Crédito: Rafael Defavari

Cometa ISON, Campinas (SP). Crédito:: Rafael Defavari

Jupiter e sua lua, Europa, São Bernardo do Campo (SP). Crédito: Rafael Defavari

Centro da Via Láctea, Campinas (SP). Crédito: Rafael Defavari

Evolução de Saturno em seis anos, São Bernardo (SP). Crédito: Rafael Defavari

Pequena nuvem de Magalhães, Araras (SP). Crédito: Rafael Defavari

Marte, São Bernardo do Campo (SP). Crédito: Rafael Defavari

Nebulosa da Águia, M16 (Pilares da Criação), São Bernardo do Campo (SP). Crédito: Rafael Defavari

Ocultação de Jupiter, São Bernardo do Campo (SP), 2012. Crédito:Rafael Defavari

Rho Ophiuchi, São Bendo do Sapucaí (SP). Crédito: Rafael Defavari

Via Láctea sobre pés de lavanda, Cunha (SP). Crédito:Rafael Defavari