Conheça 4 novos sistemas de armas nucleares que o Kremlin está testando – agora.

Russia Nuclear Arms Race Skyfall

No funeral dos 14 marinheiros russos, o Capitão Sergei Pavlov saudou os “heróis irrepreensíveis” por apagar o fogo que começou em seu submarino nuclear espião, chamado Losharik, durante uma missão secreta.

“Pagando com as próprias vidas”, disse Pavlov, “ele evitaram uma catástrofe de escala planetária”.

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Mas enquanto a Rússia testa e mobiliza uma variedade de novas armas nucleares exóticas, há o medo de que a próxima pisada na bola nuclear não possa ser contida tão cedo.

Só nesse verão no hemisfério norte, a Rússia sofreu cerca de vinte mortes em acidentes relacionados com hardware nuclear, incluindo uma misteriosa explosão ligada ao programa de mísseis Skyfall, que matou sete pessoas e gerou um pico nos níveis de radiação numa cidade próxima.

Os incidentes mortais estão abastecendo medos de que podemos retornar para uma corrida armamentista nuclear ao estilo Guerra Fria, acompanhada de acidentes perigosos e acobertamentos comuns na União Soviética.

Você pode culpar tanto Rússia quanto EUA por essa corrida armamentista renovada, que especialistas alertam estar levando a Rússia a experimentar de forma imprudente com novas ideias “absurdas”.

“Precisamos reconhecer que os russos estão envolvidos em programas malucos”, disse Aaron Stein, especialista em não-proliferação nuclear no Foreign Policy Research Institute. “Isso é um indicativo de um complexo de armamentos que foi liberado para testar projetos exóticos e bizarros. E isso é perigoso.”

Coisas que fazem buum

EUA e Rússia vêm se acusando amargamente de violar obrigações de controle de armas há décadas (Putin ainda gosta de reclamar da decisão de George W. Bush de não assinar um tratado de defesa antimíssil em 2002). Mas mesmo nesse contexto, as recriminações e demonstrações de mísseis aumentaram nos últimos anos.

O presidente dos EUA Trump tem alguma culpa nisso. Desde que assumiu, ele propôs gastar mais bilhões em programas nucleares, e começou a fabricar ogivas táticas de baixo rendimento que podem ser usadas de maneiras mais limitadas num campo de batalha, um fator que as tornaria mais propensas a serem realmente usadas.

Ele gerou ainda mais ultraje na Rússia e na comunidade internacional oficialmente tirando os EUA do Tratado INF, que oficiais americanos e especialistas independentes dizem que a Rússia violava há anos.

O Tratado INF da Guerra Fria proibia mísseis terrestres de curto e médio alcance, e seu fim significa que os dois lados provavelmente vão começar a desenvolver novos mísseis nucleares pensados para serem lançados muito mais perto de seus alvos do que era permitido anteriormente.

Putin, de sua parte, elevou as coisas ainda mais revelando pessoalmente novas armas nucleares. Num evento muito hypado, Putin se gabou de que eles seriam “invencíveis” para os sistemas antimíssil dos EUA, e mostrou um vídeo de ogivas chovendo na Flórida com aplausos estrondosos de uma sala cheia com a elite de Moscou.

Mas enquanto suas novas bombas renderam elogios em casa, Putin na verdade estava resolvendo um problema que a Rússia não tem: o país já tem tantos mísseis que poderia facilmente varrer as defesas americanas.

“O arsenal atual da Rússia não encara desafios estratégicos, e não vai num futuro próximo”, disse Joshua Pollack, editor da The Nonproliferation Review.

Mas a corrida pela supremacia militar parece estar levando os desenvolvedores de armas russos a tecnologias mais estranhas e arriscadas.

“É como se os complexos de armas nucleares tivessem recebido carta branca para perseguir suas fantasias e sonhos mais loucos, como se fosse o ‘final dos anos 70, começo dos 80 de novo’”, disse Pollack.

Alguns projetos são simplesmente “absurdos”, considerando o enorme poder de mísseis da Rússia, disse Stein.

O novo programa de armas de Putin inclui:

Skyfall: Um míssil de cruzeiro que pretende ter alcance infinito através de um motor nuclear a bordo. Uma ideia similar foi abandonada pelos EUA nos anos 1960 por ser perigosa demais, em parte porque o motor soltava gases de escape radioativos pela trajetória.

Poseidon: Um torpedo nuclear de longo alcance pensado para desencadear um tsunami radioativo de 500 metros de altura contra uma cidade costeira. Especialistas ocidentais dizem que a arma parece ter como alvo uma população civil costeira, não alvos militares.

Dagger: Um míssil supersônico de deslize lançado por avião, pensado para escapar de defesas antimíssil com velocidade e manobrabilidade avançadas.

Avangard: Um planador hipersônico que é disparado bem alto na atmosfera, depois reemerge e viaja em padrões imprevisíveis para contornar sistemas de defesa.

Desastres e acobertamentos

A atmosfera de mistério cercando esses programas militares está aumentando a ansiedade de que qualquer erro não será devidamente informado – e que moradores locais não vão receber informações vitais que precisam para ficar seguros depois de um acidente nuclear.

Esses medos foram despertados depois de uma misteriosa explosão, em 8 de agosto, que matou sete pessoas e causou um pico nas leituras de radiação em 16 vezes acima da média numa cidade próxima de quase 200 mil pessoas.

Pesquisadores independentes, e Trump num tuíte, ligaram a explosão a um teste fracassado do programa de mísseis Skyfall. Depois, a Rússia parou de compartilhar dados com observadores internacionais de estações de monitoramento de radionuclídeos próximas – por medo de causar pânico ou dar dicas da natureza de seu trabalho.

A temida agência de espionagem russa FSB teria obrigado médicos tratando dos feridos a assinar acordos de não-divulgação, e não avisou a eles que os pacientes podiam estar radioativos. Semana passada, a Rússia disse que testes aéreos tinham descoberto que quatro tipos de partículas radioativas foram liberadas pela explosão.

E esse não foi um incidente isolado. Em julho, uma equipe internacional de pesquisadores rastreou a origem de uma enorme e misteriosa nuvem radioativa que cobriu a Europa em 2017 até – advinha? – a Rússia.

A equipe disse que a nuvem não representou perigo para a Europa, mas alertou que a área ao redor de onde ela foi liberada pode ter encarado consequências muito mais sérias. E se isso aconteceu, ninguém na Rússia admitiu.

Naturalmente, depois de tudo isso, oficiais russos escolheram semana passada para lançar uma polêmica usina nuclear flutuante, apelidada de Akademik Lomonosov, num lugar com as águas mais perigosas do planeta, perto da costa nordeste da Rússia e do Alasca.

Ambientalistas alertaram que o navio é um “Titanic nuclear” e um desastre esperando para acontecer.

Sem tratados

Claro, é preciso dois para dançar o tango de uma corrida armamentista nuclear, e especialistas ocidentais dizem que os EUA também tem culpa por estimular a imprudência recente russa, depois de sair de tratados de controles de armas e fazer seus próprios testes como provocação.

“Acho que os dois lados têm culpa”, disse Sarah Bidgood, diretora do Eurasia Nonproliferation Program do James Martin Center for Nonproliferation Studies em Monterey, Califórnia. “Mas os dois lados querem apontar o dedo para o outro cara.”

Semana passada, os EUA fez um teste de lançamento de um míssil de cruzeiro de alcance médio na Califórnia pela primeira vez depois de apoiar um tratado banindo essas armas na era da Guerra Fria.

Em resposta, Putin acusou os EUA de “escalar as tensões militares”, e ordenou seu ministério da defesa a “preparar uma resposta recíproca”.

E de algum jeito, as coisas ainda pioraram. Moscou acusou Trump de não responder ligações para abrir as negociações para estender o Tratado New START, que reduziu o número de lançadores de mísseis nucleares estratégicos e deve expirar em 2021.

Não estender o New START será “fatal”, alertou o porta-voz de Putin, Dmitry Peskov, semana passada.

E sem mais precauções na Rússia, ou novas pressões por transparência, esses novos programas provavelmente serão realizados na escuridão, onde podem causar mais acidentes fatais, dizem especialistas.

“Sem dúvida veremos mais acidentes”, disse David Szankonyi, que estuda política russa na George Washington University em Washington, D.C. “Se você não estabelecer novos mecanismos de segurança, isso vai continuar acontecendo. Não vejo as coisas melhorando antes de piorarem.”

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