Costa e a cor de pele. “Que passou-se?”

António Costa primeiro-ministro de Portugal

2019 fica já marcado por um lastimável evento para os lados do Seixal. Através de um vídeo captado por um telemóvel, é visível uma agressão alegadamente desajustada por parte da polícia sobre indivíduos de raça negra. Ao ser objecto de discussão em tudo o que é plataforma de informação, essa manhã de domingo, 20 de Janeiro, no bairro da Jamaica, trouxe à baila determinadas matérias sensíveis. Nomeadamente, a complexidade de sermos ou não um país racista (no plano étnico e social), de termos diversos factores que contribuem para fortes desequilíbrios na sociedade e, claro, o excesso de algumas intervenções dos agentes de segurança.

Inesperadamente, na última sexta-feira, 25, o mais alto representante do Governo fez questão de estar no centro da problemática ao dar uma resposta descabida à líder do CDS. Ao ser interpelado sobre se condenaria a posição tomada pelos polícias, António Costa deixou no ar que a sua interlocutora teria motivos raciais para lhe colocar a questão. “Está a olhar para mim e deve ser seguramente pela cor da minha pele que me pergunta se eu condeno ou não condeno, os actos de vandalismo em Portugal!”, afirmou Costa, perante um auditório boquiaberto (inclusive os seus colegas do Executivo).

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Como o primeiro-ministro não justificou a inadequada declaração (e um pedido de desculpas ainda não saiu do seu gabinete), tentei imaginar os motivos que o levaram a rubricar o impetuoso devaneio. São sete e nenhum serve de desculpa para lhe ter “saltado a tampa”.

1. Acossado pelas constantes críticas de Assunção no Correio da Manhã, jornal e TV

Com Rui Rio prisioneiro do seu desejo escondido (ou, por outras palavras, o objectivo envergonhado de ser vice de António Costa), é Assunção Cristas que protagoniza a verdadeira oposição no Parlamento. Essa conspícua realidade não fica por aí e, semanalmente, os ataques à governação aparecem plasmados no Correio da Manhã (TV e jornal.) As acções e as respostas do primeiro-ministro aos problemas dos portugueses, são o principal alvo da dirigente centrista.

2. Fartinho das perguntas sobre o Caso Jamaica

Depois do triste episódio no bairro social, era inevitável que um alegado abuso de poder das autoridades policiais viesse à tona no plenário. O Bloco e o PCP espicaçaram de tal forma Costa sobre o sucedido, que os nervos do secretário-geral do PS soltaram a carta improvável: a sua cor de pele e um eventual racismo da bancada do CDS. Até o deputado Hélder Amaral ficou amarelo com a observação lunática que acabara de escutar.

3. Lixado ao ver a maioria absoluta por um canudo

Tensão. Muita tensão. O Partido Socialista ambiciona continuar em São Bento, mas parece encravado nas sondagens no que a uma possível maioria absoluta diz respeito. A solução vai passar novamente por ter de “aturar” as constantes reivindicações de Catarina Martins e de Jerónimo de Sousa, ou por pedir a “bengala” emprestada a Rui Rio? Daqui a nove meses, veremos o que dão as Legislativas.

4. Jogada de antecipação para que Van Dunem não sofra nenhuma espera tola

Referindo-se ao incidente no bairro da Jamaica, o assessor do Bloco de Esquerda e um dos representantes do SOS Racismo, Mamadou Ba (senegalês com nacionalidade lusa e com filhos portugueses) despoletou várias reacções ao utilizar a expressão “bosta da bófia“. Uma das quais veio da extrema-direita. Dois elementos do PNR fizeram uma [inconcebível] espera a Mamadou e – enquanto gravavam a abordagem – questionaram, por exemplo, o facto de o seu ordenado ser pago pelos contribuintes.

Uma pergunta. Se este partido julga que é normal utilizar o tom agressivo por causa do salário e raça de um indivíduo, o que faria se encontrasse os pelintras que desviaram milhões do Estado? Uma constatação. Se calhar, António Costa ao mencionar a sua cor de pele quis mandar a seguinte mensagem aos extremistas: “Se querem enfrentar algum negro com peso no País, escolham a minha pessoa e deixem a ministra Van Dunem em paz. Já tenho atritos que cheguem com Angola”.

5. Saturado de ser criticado nas redes sociais

Desde que avançou para a “geringonça” em 2015, Costa tem sido acusado de ser “usurpador” (por não ter ganho as eleições e por ter desrespeitado a vitória da coligação PSD/CDS). “Golpista” e “monhé” são outros dardos atirados contra a sua verticalidade política e origem familiar, respectivamente. Às tantas, umas horas antes de enfrentar os deputados, andou a ler o que dizem sobre si nas redes sociais e, quiçá, a irritação começou a florescer…

6. Agastado pela derrota do Benfica frente ao Porto

Sabendo que o PM é adepto confesso do Benfica, não estranharia que tivesse ficado perturbado por ter visto o clube sair derrotado, frente aos portistas, na meia-final da Taça da Liga (jogo disputado na terça-feira anterior ao debate). Como outros milhares de simpatizantes dos encarnados, será que ficou a matutar sobre o lance do fora-de-jogo e a questionar o “que passou-se” com o VAR?

7. Truque para que Ferro Rodrigues desse um ar da sua graça?

Se há certezas que aprendemos do momento “skin awkward”, é a de que Ferro Rodrigues consegue ser imparcial. Após a polémica declaração, o presidente da Assembleia da República abriu o microfone para acalmar os ânimos do amigo Costa. Talvez, todo este imbróglio tenha sido criado para que Ferro Rodrigues ficasse bem na fotografia – o que raramente acontece quando ele e Carlos César (outro socialista com inúmeras frases “pequeninas”) abrem a boca. Por fim, um conselho aos três. Façam por praticar desporto e aproveitem para relaxar os neurónios (ver abaixo o clip dos suecos Viagra Boys). Menos stress, menos bacoradas ditas.


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