Nenhum aparelho ganhou mais atenção durante a pandemia de coronavírus que o respirador, que dá a alguns pacientes com covid-19 grave uma chance de lutar pela vida. Acesso a um respirador pode ser a diferença entre a vida e a morte, e escassez de respiradors na Itália e uma escassez em potencial no resto do mundo se tornou um dos problemas logísticos mais críticos para resolver durante a pandemia.Enquanto todos os níveis do governo disputam a compra e distribuição de aparelhos médicos de respiração, grandes corporações como a General Motors e General Electric e figuras da indústria de tecnologia como Elon Musk estão entrando na briga para tentar aumentar rapidamente a produção ou criar modelos mais fáceis de produzir. Simultaneamente, esforços de fabricação independente de código aberto têm prosperado. A complexidade desses projetos varia de basicamente automatizar um reanimador manual, como o AmboVent da Força Aérea Israelense, até adaptações de aparelhos médicos já existentes para serem usados pelos profissionais de saúde. Fabricantes de jogos de computador criaram protótipos de respiradores, professores universitários dizem que modificaram batedeiras KitchenAid para fazer respiradores, e hacker desbloquearam máquinas CPAP para transformá-las em respiradores improvisados. Médicos e enfermeiras descobriram maneiras de usar respiradores em mais de um paciente. A fabricante de aparelhos médicos Medtronic até fez uma contribuição para os esforços de código aberto, liberando especificações e documentos de seus respiradores PB 560, um modelo que começou a ser fabricado em 2010.
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Esses esforços são louváveis, urgentes e infelizmente necessários. Mas transformar uma fábrica de peças de automóveis numa fábrica de aparelhos médicos não acontece da noite pro dia, nem passar de um protótipo de código aberto num laboratório de pesquisa e desenvolvimento para um equipamento de nível médico seguro para ser usado em pacientes reais. Mesmo a General Electric, que tem uma divisão que já faz respiradores, disse a Motherboard que dificilmente eles poderiam alterar fábricas de outras divisões para fabricar mais respiradores.Os muitos, muitos passos que entram em fazer respiradores numa época de não pandemia – o design, cadeias de fornecimento, burocracia, manutenção – em alguns aspectos não são tão diferentes dos processos subjacentes de qualquer produto industrial feito numa economia global. Onde esse processo tradicional está sendo quebrado atualmente, e o que projetos de código aberto estão tentando contornar, colocam questões de ética médica muito difíceis, incluindo se deveríamos ou não tratar aparelhos médicos como qualquer outro produto industrial. Enquanto há dezenas de projetos tentando fazer respiradores, todos têm enormes bloqueios para superar antes de poderem ser realmente usados para tratar pacientes com covid-19.Há algumas maneiras de começar no mundo do design e fabricação de respiradores. Uma opção antes do covid-19 seria mais ou menos assim:1. Frequente uma faculdade de medicina
Para começar
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2. Se especialize em aparelhos respiração3. Depois de anos no campo, passe para a indústria (talvez até funde uma companhia)Considerando as circunstâncias atuais, pode ser difícil seguir esse caminho. A boa notícia é que muitas pessoas que seguiram ainda estão trabalhando e querem muito ajudar. Muita gente quer ajudar a resolver a crise de respiradores agora – o que é ótimo, por que vai ser preciso muita gente pra fazer isso. Além da abordagem colaborativa exigida para unir hardware complexo e engenharia de software, em cenários de hospitais esses aparelhos também exigem que especialistas e técnicos passem por muito treinamento para manter e operar esses aparelhos.Muita gente desse campo já sabe e entende isso, e várias abordagens DIY sendo tentadas agora reconhecem a necessidade de colaboração com especialistas. Jeffrey Yoo Warren, fundador da comunidade científica sem fins lucrativos Public Lab e envolvido com projetos de hardware de código aberto, vem acompanhando as ideias que estão emergindo e observou que “Essas pessoas não recebem tanto reconhecimento como inovadores quanto os próprios profissionais de saúde”, citando o trabalho dos médicos do Mt. Sinai em Nova York que desenvolveram um protocolo para modificar máquinas BiPAP como exemplo.“No geral, acho que há uma desconexão entre o ideal de ‘empreendedor’ de inovação e o que nos torna parte do cuidado de pacientes no dia a dia”, continuou Warren. “Um respirador não é uma solução. É uma ferramenta que é combinada com outras e terapias de um jeito criativo e responsivo por uma equipe médica.”
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O que é um respirador?
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Na maior parte, as iniciativas de código aberto atuais não estão dizendo que podem construir respiradores de cuidado intensivo. Govind Rajan, anestesiologista da escola de medicina da UC Irvine e colaborador do projeto de respiradores Bridge Ventilator Consortium, descreveu o caso de uso desse projeto como “apenas em situações onde você não tem nenhum respirador disponível e o paciente precisa muito de um”. Numa colaboração com o consórcio, a Virgin Orbit criou um respirador da variedade “reanimador manual automatizado”. Isso não chega nem perto de ser tão complexo quando um respirador de cuidado intensivo.Mas Rajan descreveu cenários onde “chega uma hora que você precisa ser retirado de um respirador”, e disse que o design de sua equipe pode servir para necessidades de pacientes que precisam ser retirador e não precisam de um aparelho de cuidado intensivo (ou seja, funcionando como uma “ponte” entre cuidado intensivo e ser retirado de um respirador). Em seu site, a Virgin Orbit também descreve o respirador (que ainda não foi aprovado pelo FDA dos EUA) como possivelmente servindo “um grande volume de pacientes com sintomas moderados de covid-19”.Essa descrição aparentemente contraditória – um respiradorr que é tanto uma opção de pior caso e servindo para um estágio intermediário de tratamento de covid-19 – introduz questões sérias de ética médica na busca por mais respiradores. Para médicos tentando salvar pacientes por qualquer meio necessário, um respirador de viabilidade mínima é melhor que nenhum. Rajan relembrou suas próprias experiências quando começou sua carreira trabalhando na Índia 35 anos atrás, onde a disponibilidade de respiradores era pequena e reanimação manual às vezes era a única opção para manter um paciente respirando. Ter que escolher entre uma ferramenta de último recurso e um aparelho de cuidado intensivo ainda é um privilégio que alguns médicos não têm agora.
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“Muitas coisas são melhores que nada. A questão é: esse aparelho é capaz de atender as necessidades do paciente?”, pergunta Rich Branson, professor do departamento de cirurgia da Universidade de Cincinnati e editor-chefe do jornal científico Respiratory Care, quando perguntei sua opinião. Enquanto os médicos aprendem mais sobre o COVID-19 e seu tratamento, houve uma reavaliação da corrida para produzir ferramentas de “último recurso” sobre simplesmente investir em respiradores de cuidado intensivo – por exemplo, o sistema de saúde do Reino Unido recentemente cancelou um contrato para milhares de respiradores feitos pelo Formula One Group da indústria de corridas, porque os considerou insuficientes para atender as necessidades de pacientes com COVID-19. Enquanto isso, projetos que se descrevem como adequados para pacientes infectados com COVID-19, mas não precisam (mais) de respiradores de cuidado intensivo, correm o risco de “inventar um paciente que não existe”, alertou Branson.Branson aprecia as boas intenções desses projetos, mas teme que o público – e algumas das organizações e agências federais os financiando – não entendam completamente que eles são “tampões”, não uma solução para não ter respiradores de cuidado intensivo. “A pior solução é aquela que faz as pessoas acharem que estão recebendo tratamento efetivo quando não estão”, ele disse. Entender que tipo de respirador um paciente está recebendo, e o que ele pode ou não fazer, é crucial para evitar expectativa equivocada.
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O que tem num respirador?
“Não estamos fazendo clipes de papel. Estamos fazendo equipamento de suporte à vida que às vezes serão necessários inesperadamente . ”
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Como conseguir aprovação para respiradores
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As cadeias de fornecimento de respiradoresMas para chegar nesse estágio de produção, primeiro precisamos ter uma cadeia de fornecimento para todos os componentes do seu aparelho. Respiradores têm muitas peças, e os fabricantes deles geralmente não fazem essas partes. Enquanto os esquemas e componentes dos respiradores geralmente são informações de propriedade dos fabricantes, podemos ter um vislumbre disso do “código aberto” do respiradorr PB 560 do Medtronic – com algumas ressalvas.Enquanto a companhia foi longe para compartilhar seu material enquanto simultaneamente aumentava a produção, isso pinta uma imagem ligeiramente incompleta da cadeia de fornecimento. A Medtronic liberou os documentos do PB 560 numa série de versões escalonadas, o que significa que há alguma variação nos níveis de detalhe dos documentos. Em uma versão, a Medtronic publicou listas individuais de materiais para seis componentes incluindo os nomes dos vendedores deles; na versão final, eles publicaram uma única lista de materiais para o aparelho inteiro, sem os vendedores. Mas mesmo com essas lacunas, os documentos do PB 560 fornecem uma boa visão da complexidade das cadeias de fornecimento dos respiradores.Os documentos em conjunto, por exemplo, listam 65 partes diferentes. A lista total de materiais contém 613 itens. Entre as seis listas de materiais para componentes específicos publicadas (principalmente para componentes de placa de circuito impressa), há 78 fornecedores para coisas como capacitores, diodos e resistências, cada um provavelmente tendo seus próprios fornecedores de material bruto. O coronavírus está afetando as cadeias de fornecimento global para tudo, então é possível que esses componentes brutos não estejam disponíveis agora. Para reiterar, esses são os fornecedores para apenas uma fração dos 613 itens do aparelho, e o PB 560 é um dos modelos relativamente mais simples de respiradores disponíveis.
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“Você vai encontrar muitos fabricantes de respiradores conseguindo componentes dos mesmos lugares”, disse Mark Rogers, gerentes de projetos da fabricante de respiradores Nihon Kohden OrangeMed. Rogers está no negócio de cuidados respiratórios há mais de 35 anos, e trabalhou no desenvolvimento e produção de vários respiradores de cuidado intensivo e neonatal. Companhias tentando aumentar a produção de respiradores agora estão competindo pelas mesmas peças. “É um negócio muito incestuoso. As pessoas passam entre empresas e você começa a ver elas usando os mesmos conceitos ou fornecedores”, ele disse.Isso contribui para o desafio de ter respiradores suficientes agora, mas diferentes componentes encaram desafios diferentes. Alguns dos componentes mais conceitualmente centrais, como uma turbina usada para pressurizar o gás, tipicamente são um pouco mais personalizados, então há menos competição por essas partes – mas muitas das partes constituintes dos respiradores, como mangueiras de gás ou válvulas solenoides, atualmente estão em falta.Dependendo da abordagem sendo usada, projetos DIY e de código aberto vão encarar mais ou menos dos mesmos desafios. O Bridge Ventilator Consortium, da parte deles, deliberadamente procura componentes fora da cadeia de fornecimento médica tradicional e portanto com menor demanda agora, como de motores para limpador de para-brisas.Rogers expressou algumas frustrações sobre como a lógica da cadeia de fornecimento funciona contra o preparo para uma emergência médica. “Você não tem cadeias de fornecimento de última hora para equipamentos como esse”, ele disse. “Não estamos fazendo clipes de papel. Estamos fazendo equipamento de suporte à vida que às vezes serão necessários inesperadamente.”
“Respiradores que fazem coisas especiais são onde pessoas como eu investem suas vidas. ”
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