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Esse cara está cruzando os EUA usando o Google Street View, um clique de cada vez

Un drum din Montana pe Street View

No dia 19 de junho, Uday Schultz caiu na estrada. O aluno de 19 anos da Harvard decidiu passar parte das férias de verão realizando um sonho que tinha desde criança. Ele iria cruzar o país. Mas não tendo carro e no meio da pandemia, ele decidiu fazer isso de sua casa no Brooklyn. Então Schultz entrou no Google Street View, foi para Seattle, e começou a clicar no caminho de volta pra casa.

Estou tão entediado com a pandemia quanto todo mundo. Por enquanto estou ganhando a Copa do Mundo de Não Pode Piscar com meu gato, porque ele se distrai muito fácil. Mas mesmo eu nunca considerei “cruzar” o país pelo Google Street View. Então achei que Schultz tinha alcançado o God Mode do Tédio da Pandemia.

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Decidi dirigir de Seattle para NYC pelo Google Street View. Tenho pensado nisso desde que a quarentena começou, mas agora resolvi finalmente começar. Vou tentar passar 30 a 60 minutos por dia até chegar ao meu destino. Vou postar atualizações periódicas aqui. Esse é meu ponto de partida

Mas Schultz não está fazendo isso porque está entediado. Bom, não tanto quanto eu esperava. Ele está clicando de volta pra casa do outro lado do país como um tipo de projeto de pesquisa.

“Eu não achava que seria uma coisa gigante que eu ia lembrar pra sempre”, Schultz disse a Motherboard. “Mas a experiência acabou ganhando vida própria.”

Schultz pegou a rota norte pelo país para poder ver algumas das infraestruturas industriais, de transporte e de energia mais famosas do país, uma das paixões dele. Ele pega desvios para ver silos de grãos, minas abandonadas, estradas de ferro antigas e qualquer outra coisa que chame sua atenção. Ele tenta evitar as interestaduais o máximo possível porque elas geralmente são chatas. Se ele acha alguma zona morta onde não existe Street View – e são poucas – é fácil dar meia volta. Ele diz que essa viagem por cliques é muito mais rápida do que seria de carro, quando você descobre onde precisa clicar exatamente no horizonte. Mas cuidado: se clicar muito alto, o Street View te manda de volta sem explicação.

Depois de um mês clicando – ou dirigindo, como você preferir – Schultz agora está a 96 quilômetros noroeste de Duluth, Minnesota. Mas ele não consegue estimar quando vai terminar a viagem, porque acha que vai acabar pegando mais desvios nas partes mais densamente povoadas do meio oeste e leste do país.

Normalmente, cruzar o país pelo Street View seria bem menos atraente que fazer a viagem no mundo real; sabe, estar realmente lá. Mas é isso que torna o projeto perfeito pra este momento. Todo mundo está vivendo alguma versão da viagem pelo Street View, experimentando o mundo através do que nossas telas mostram.

Sei que engenheiros rodoviários odeiam (com razão) saídas à esquerda, mas o jeito como essa implicância obriga duplicação da infraestrutura de áreas de descanso é algo que sempre me incomodou

A Colúmbia! Uma das maiores (por fluxo) e mais pesadas barragens de rio dos EUA; provavelmente uma parte central da complexa geografia de energia ocidental.

Depois que Schultz me contou sobre alguns dos lugares que viu, das barragens do Rio Missouri até as ferrovias abandonadas Milwaukee Road, perguntei se ele sentia mesmo como se tivesse visto esses lugares. Ele pensou por um segundo. Nós dois moramos em Nova York, e ele comparou sua viagem pelo Street View com andar pela cidade nos últimos meses. Podemos sair andando por aí se quisermos, mas não podemos entrar nos lugares. “Você pode andar pela cidade”, disse Schultz, “mas não pode interagir com ela”.

Ele não pode estar fisicamente presente, digamos, nas barragens construídas em terras de nativos americanos, obras que deslocaram as tribos locais e tiraram recursos vitais de água e vida selvagem vitais para elas, mas ele pelo menos as viu.

Perguntei a Schultz se ele estava contando essa experiência como uma viagem real. O que fez ele parar pra pensar mais uma vez, o que me fez parar pra pensar por que eu estava enchendo o saco desse colega universitário com perguntas filosóficas ridículas. Eu estava fazendo essas perguntas porque estou desesperado pra sair de tudo isso. Nem tanto porque quero estar em outro lugar físico, mas quero fugir de como me sinto com tudo que está acontecendo agora. Pulo entre a cama, o sofá, a mesa, talvez saindo para uma corrida ou andar de bicicleta, mas tudo parece vazio. Eu queria que ele me dissesse que sua viagem pelo Street View é um substituto para uma viagem real, que ele me desse a esperança de que posso encontrar substitutos para todas as coisas de que sinto falta.

Schultz não deve voltar pra Harvard tão cedo. A universidade anunciou recentemente que todas as aulas para o ano escolar de 2020-21 serão online. Não vejo meus colegas há meses. Quase não passei tempo com a família. Fiz algumas happy hours pelo Zoom com amigos quando tudo começou, mas como todo mundo, ninguém se empolga pra repetir. Assisti um show de stand up online onde os comediantes se esforçaram pacas, mas a experiência foi meio constrangedora e triste, porque só lembrou tudo que estamos perdendo. Essas experiências foram Zoomificadas, ou seja, parecem tipo um cenário de filme da vida que a gente tinha, com todos os andaimes e placas, mas nenhum interior ou significado. Essas coisas são substitutos toscos para as coisas reais, assim como fazer uma viagem pelo país sem carro. Todo mundo vive no Street View agora, onde tudo é real mas nada está realmente lá.

Depois de alguma discussão, chegamos ao veredito que essa experiência não conta como uma viagem de verdade. “Algo realmente se perde pelo Street View, mesmo que seja só o cheiro do ar”, disse Schultz. “Passar de carro por uma usina de papel tem um cheiro. Você perde esse cheiro.” Mas ele ainda acha que é melhor que nada.

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