O embate entre os professores da rede estadual de São Paulo e o governador Geraldo Alckmin continua. Hoje (22), a greve alcança o 70º dia e a situação ganha contornos ainda mais dramáticos, já que, na última quarta-feira (20), o Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu ao governo do Estado o direito de suspender o pagamento de salários dos grevistas. Na tarde de hoje, aconteceu no Vão do Masp, na cidade de São Paulo, uma assembleia estadual em que a maioria votou a favor da continuação da paralisação.
Porém, o corte dos pagamentos assusta. “Essa é a nossa maior angústia, a maior preocupação”, lamenta Nilton Vieira, professor de história e geografia da rede estadual que leciona na cidade de São Bernardo do Campo. Ainda que, para contornar a situação, a Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo) recorra ao fundo de greve, patrimônio do sindicato destinado a cobrir eventuais descontos na folha de pagamento dos sindicalizados que aderiram à paralisação. “Descontaram 17 dias de março”, explica Nilton. “Agora, estamos em maio, e terei o próximo mês praticamente todo descontado.” Além da arrecadação feita pela própria Apeoesp, movimentos sociais de esquerda e de oposição se sensibilizam com a causa, organizando eventos para levantar verba destinada ao fundo de greve.
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O sindicato afirma ter entrado com recurso para barrar a decisão da Justiça e acusa Alckmin de ter ido “pessoalmente a Brasília para conversar com o presidente do STJ”. A presidente da Apeoesp, Maria Izabel Azevedo Noronha, conhecida como “Bebel”, mostra indignação e critica o suposto artifício político: “Estamos em meio a uma batalha jurídica na qual o governador de São Paulo se utiliza de expedientes que são vedados às pessoas comuns”.
A falta de pagamento deve ser um fator decisivo na próxima reunião programada para sexta-feira (29). Sem salário, parte dos professores pode votar contra a paralisação. Bebel diz à VICE que os membros do sindicato receberam a decisão do Judiciário “com tranquilidade, mas indignados”. Ela acredita que o despacho assinado pelo ministro Francisco Falcão não tenha uma influência decisiva. “Os professores estão em greve pela convicção de que precisam ser atendidos em sua pauta de reivindicações. E vamos continuar até que a categoria decida que é momento de parar, seja pelo atendimento de nossas reivindicações centrais, seja por qualquer outro motivo considerado relevante”, frisou.
Da pauta de reinvindicações, constam aumento salarial de 75,33%, a diminuição da quantidade de alunos em sala de aula (educadores dizem que algumas chegam a comportar 60 estudantes no ensino regular e 90 no ensino de jovens e adultos) e a reabertura de 3.390 classes fechadas no começo do ano, de acordo com o sindicato.
Por e-mail, a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo afirma tratar-se de “uma greve isolada […], contaminada por interesses incompatíveis com o momento econômico atual”. De acordo com a pasta, cinco propostas foram feitas, “garantido a manutenção da política de reajuste salarial”. Para o professor Nilton, sucatear a categoria não é justificativa. “Por conta de uma crise econômica que está acontecendo no país, eles [governantes] se acham no direito de sacrificar o trabalhador”, destaca.
A Apeoesp não quer ceder e afirma que “a tendência é pela continuidade da greve, pois o Governo não fez propostas que atendam nossas necessidades”.
A paralisação na educação não atinge somente São Paulo. Segundo a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), outros cinco Estados brasileiros também estão em greve. São eles Goiás, Pará, Paraná, Santa Catarina e Sergipe.
Dez reais e quarenta e três centavos: isso é o que ganha por hora-aula um professor dos anos iniciais do ensino fundamental no Estado de São Paulo. A precariedade não está somente na remuneração da classe, mas também no ambiente escolar. “Não temos papel higiênico nas escolas. Não tem computador, não tem impressora, não tem tinta pra pintar as paredes e os materiais estão todos estragados”, lamenta Carolina Zundt, professora de geografia da rede estadual que atua na cidade de Assis, interior de São Paulo. “Só não falta giz; senão, a escola fecha.”
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