Da Rise And Fall of Da Tower é o primeiro livro de Bruno Galan, um artista gráfico/DJ Mendigo/Panque da Zapim/“desenhista de traço reconhecível pelas ruas de São Paulo”. Fala da Torre [do Dr. Zero], ainda que não seja mais um livro sobre a Torre, mesmo porque nele a extinta balada funciona mais como um ponto de referência à história do protagonista eneagá (de NH, de “Nosso Herói”, o alterego do Bruno) — que parte “rumo ao acaso, ou às ciladas augustas da babilônia” — que como um cenário propriamente dito. Referências, aliás, são o que não faltam em suas páginas, a notar pelo título (Ziggy Stardust, alguém chutou?). “Eu cresci indie”, diz Galan. Enfim, é uma história “adultescente” em toada esquizofrênica. Seu lançamento, pela editora independente Touro Bengala, acontece na quarta-feira, dia 25, no Z Carniceria.
VICE: Que história é essa de você ter sido investigado pelo FBI?
Bruno Galan: [Risos]Ah, isso foi um e-mail que eu mandei quando era moleque. Você jura que quer falar disso?
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Sim. Fala aí.
Tinha uma época em que o site do Radiohead tava com um link aberto pra enviar umas mensagens para o Bill Clinton. Eu mandei uma, falando “I will kill you”. Daí o FBI veio atrás de mim. Me acharam pelo IP da máquina, e aí ligaram no trabalho e um cara do Financeiro veio me perguntar se eu tinha enviado um e-mail pra Casa Branca. Disse que sim, e ele: “Então, os caras estão aí e querem falar com você”. Aí tive que ir até uma delegacia de São Paulo esclarecer que eu não queria matar ninguém e que não ia matar ninguém — que era só um emo revoltado contra o sistema. Falei isso, estava uma delegada brasileira e um cubano naturalizado americano. E eles me disseram que vão atrás de todas as ameaças, umas 300 por dia — se eu tivesse escrito “I want to kill you” eles não teriam tido problema.
Mas você assinou sua ameaça ao Bill Clinton feita pelo site do Radiohead?
Assinei como Bruno [risos]. E como só eu usava o PC que eu trabalhava, não ficou muito difícil pra eles me acharem.
Seu nome também aparece como presidente da juventude tucana do Tocantins. Já te investigaram por isso?
É, eu já vi [risos]. E como um jogador de xadrez também. Mas não sou eu.
Bom, sobre seu livro, então. É o seu segundo, não?
Cara, na verdade é o primeiro mesmo. Na internet sai como se o Saga Animal — Minha Batalha Por Um Bicho de Estimação fosse meu, mas não é. Eu só ilustrei ele, mas alguém deve ter errado no registro e essa notícia espalhou.
E como surgiu Da Rise And Fall of Da Tower?
Eu trabalhei cinco anos na MTV. Saí de lá e resolvi sair pra viajar pelo Brasil. Fui até pensando em não voltar — já estava meio de saco cheio de São Paulo, e acho que o livro mostra bastante disso. Aí eu aluguei uma casa em Boipeva com uma amiga minha, e a maior parte do livro eu escrevi lá. Tinha acabado de sair de São Paulo e ficava lembrando das coisas, estava desintoxicando. Aí escrevi caretão lembrando da esquizofrenia que tinha acabado de acontecer. Mas eu já escrevi bastante, desde moleque, desde Bauru. Só que não imaginava que fosse conseguir reunir um texto que fosse virar um livro – se é que isso dá pra chamar de livro.
É uma obra autobiográfica?
Eu sou um retirante de Bauru que veio tentar a sorte na capital. Vim fazer faculdade de cinema na FAAP, mas acabei não terminando. Então pode falar que é bem autobiográfico. [O protagonista eneagá também é um retirante de Bauru frequentador da Torre]. Mas alguns personagens são reais, outros não.
É uma história “adultescente”, palavra que você usa no livro?
Um adultecente é um adulto adolescente — um adulto que consome para se afirmar. Para mim a nossa sociedade atual é toda de adultescentes, obviamente comigo incluso. Não vou te colocar no balaio, vai que você fica bravo [risos].
E por que usa tanto o inglês no livro, a começar pelo título?
Acho que pelas referências. Do funk ao Daft Punk, do Rise And Fall of Ziggy Stardust and The Spiders From Mars, do Bowie, das bandas indies etc.
E por que decidiu fazer da Torre um ponto de referência no seu livro?
A Torre é um lugar que eu ia toda quinta, onde encontrava o pessoal. Era um lugar onde todo mundo se encontrava como se não houvesse amanhã. Então foi um negócio importante pra mim. O livro conta uma história incompleta do eneagá, uma coisa que meio que não acaba. É meio esquizofrênica, acho que dá pra falar um fluxo de consciência, misturada com uma história que tem no meio, mas não chega até o final. A Torre foi importante para um monte de gente. Na história o cara tá indo pra Torre, descendo a Augusta e pegando o táxi. Eu acho que a Torre era um lugar importante pra diversão. Peguei todas as épocas da Torre.
De lá também saiu a banda que a gente fez – na verdade já existia, a Caxabaxa, que o Carlinhos fez com o Adriano. Quando eu tava nessa viagem eu escutei “Torre de Quinta”, uma música que eles fizeram juntos, e eu falei: “Quero entrar nessa banda”. Eles falaram tudo bem, e aí eu fiz com eles o “Panque da Zapim”, que fala desses punks de boutique.
Você já deve ter visto o B.O., que saiu na semana passada — também sobre a Torre. Fala de um B.O. seu então.
Meu eu não lembro, mas tem um clássico que foi uma vez que um cara cagou do lado do fliperama [risos].
E não foi você?
Não! Não confunda, hein, pelo amor de Deus [risos]. Mas acho que todo mundo ficava de B.O. lá.
E você chegou a tocar lá, né, como DJ Mendigo?
Sim, eu fazia o show DJ Mendigo. Era de funks cariocas com letras filosóficas, bem antes do Marcelo Adnet…
Exato. Queria mesmo saber o que você achou do vídeo do Adnet da “Gaiola das Cabeçudas”.
Cara, eu me sentiria ridículo falando que roubaram minha ideia, mas acho que todos os humoristas são umas antenas que veem o que está rolando e fazem as piadas deles. Só que ele foi bem além, fez um negócio gigante, com uma puta letra. Que eu admiro, não tenho nada contra, assim, não me sentiria à vontade dizendo que o cara me imitou. Mas eu acho engraçado.
Você trabalhava na MTV. Nunca foi tirar satisfação com ele?
Eu falei. Uma vez encontrei ele na padoca e disse que também já tinha feito um funk com letras filosóficas. Ele: “Ah, legal.” Perguntei: “Você já ouviu o DJ Mendigo?”. Ele: “Vou escutar.” Ele já deve ter escutado. Mas não acho que ele exatamente imitou ou chupou, não tenho esse tipo de sentimento, mas que eu acho que tem uma coisa ali… Mas também não posso dizer que as coisas que eu faço saem exatamente de mim. Sempre tem alguma coisa que você escutou de alguém e tal, e não lembra.
No seu livro, por exemplo, de onde acha que vieram essas “coisas que você escutou de alguém”, as influências?
Cara, no modo de escrever eu tenho umas influências que nem são tão literárias. Pra mim o Leonilson foi uma influência nesse negócio de listar as coisas, sabe? Fazer uma lista de coisas que você vai pensando e depois elas vão fazendo um sentido. E, putz, eu só li Cortazar na minha vida, não fui um cara que leu muito. Uma vez encanei nele e comprei todos os livros dele, então deve ter alguma coisa. Curto os livros do Chico Buarque também – o Estorvo principalmente.
Seu livro é bem cheio de referências…
De música tem referência pra caralho. Eu cresci indie, né, daí cheguei em São Paulo e conheci a música eletrônica.
Pretende escrever mais?
Eu fiquei a fim de escrever mais. Até o pessoal da Touro Bengala falou que achava que eu deveria continuar a escrever. Isso me incentivou demais, agora que está na minha mão. Pô, durmo abraçado com o bagulho.
Falta algo na noite paulistana como a Torre?
Falta, mas eu não iria. Acabei de tomar banho [risos].
ENTREVISTA POR BRUNO B. SORAGGI
IMAGENS: ILUSTRAÇÕES DO LIVRO, CORTESIA DE BRUNO GALAN