Música

QUEM VAI RAMELAR NA MISSÃO?

Talvez comece hoje, pelo YouTube, O Ramelão, o reality show da favela no qual oito pessoas – dentre as quais uma ex-socialite-agora-funkeira, um morador de rua e um MC ex-famoso – vão ser confinadas por um mês em um barraco de vinte metros quadrados na favela (aka comunidade) Vila Praia, no Morumbi, em São Paulo, tendo direito a uma marmita por dia. Ideia da cabeça do Pedro Paulo Paulo Mendes Vieira (vulgo Ex Milionário), a mesma máquina de genialidades que o levou à conclusão de que seu casamento com uma psicóloga milionária tinha que acabar pra ele poder ser pobre de novo e se dedicar à sua carreira de artista – daí o apelido, entendeu?


Pedro Paulo e o chamado ao heroi.

Videos by VICE

Dentre suas outras artes ele resolveu levar pra frente a ideia dessa empreitada. “Analisando os programas de televisão a gente vê que tudo caiu numa mesmice, inclusive os reality shows, que têm sempre figurinhas carimbadas, modelos, alemães de olhos azuis e mulheres de corpos esculturais. Só que esse não é o tipo de pessoa que a gente vê nas ruas todos os dias, então resolvi criar esse programa, com pessoas de verdade.”

Se as gostosas se pirulitam quando ele chega perto, se “alguma coisa vai ao ar hoje mesmo”, como ele me disse – as filmagens já foram adiadas uma vez -, ou se vai ser um “divisor de águas” na programação brasileira, como o Pedro acredita, eu não sei. Só sei que, se o senhor está lembrado, desde uma saudosa maloca de artistas não se tinha donde poder passar dias felizes de nossas vidas como este lugar, então dê-lhe a licença de contar:

Vice: Então você vai ser tipo o Bial?
Ex Milionário: Isso! Até comecei a brincar que meu nome agora é Pedro Paulo Bial Piccoli Júnior [risos]. Faz a junção de tudo, do Britto Júnior [apresentador de A Fazenda], o Edgard [Piccolli, de Busão do Brasil]… E eu vou apresentar O Ramelão, pô, o reality show da periferia, o reality show de verdade!

Quem vão ser os participantes?
Um é o MC Frank Bruno, um cantor de hip-hop que fez muito sucesso nos anos 80 [com a música “Mas Que Linda Estás”] e que desapareceu da mídia. Ele tá tentando voltar às paradas de sucesso, mas não canta nada [risos]… Inclusive ele vai ser muito indagado no programa porque realmente ele não canta nada. Ele canta muito mal, mas é uma pessoa divertida. Vai ter também uma esteticista que sonha em ser celebridade. É uma senhora que acha que é modelinho da Playboy, que vive indo em festas, vive apresentando televisão pela internet… Vou colocar também, entre esses, um mendigo, que é o Cicinho, morador de rua faz 30 anos – e três meses que não toma banho. Ele vive fora da realidade – nem sabe o que tá acontecendo –, mas tá feliz que vai ter uma casa pra dormir. Colocamos uma transexual também, que faz show à noite. É a Paula Campos, campeã de boquetes da rua Augusta.

Uau! Qual o recorde dela?
Olha, parece que foi, numa noite, mais de 200. Segundo ela, né? Agora imagina ela com uma socialite, a Heloísa Faissol – que é conhecida no Brasil todo por abandar a alta sociedade do Rio de Janeiro pra virar funkeira… Tinha um capoeirista também, o mestre Salsicha, mas ele é tão polêmico que já causou polêmica antes de entrar, então foi cortado.

Que tipo de polêmica?
Ele fez algumas figurações para programas da rede Globo e por isso acha que é contratado de lá. Então ele brigou, falou que a Globo não ia gostar de ele estar participando de outro reality show [risos].

[Risos]
Tem o Leonardo, também, que é um negão que só tem dois dentes na boca – o zagueiro e o atacante… Ele fala e ninguém entende nada. Tem o cigano tarólogo Landi, aquele biruta que acha que o mundo vai acabar em 2012, que não vai ter Copa… Ele anda com uma bruxinha do lado, uma cruz no pescoço e um lenço na cabeça. Tem o motoboy maluco, que é o Eli, que veio da Bahia. Ele é motoboy e ciclista maluco, conta várias histórias, bem mentiroso [risos]. Ele fala que foi pra Paraíba em um dia de bicicleta! É tipo um Forrest Gump. Vem o Júlio, que é um cinegrafista metido a galã, bad boy. Mó ramelão, já foi mandado embora de vários programas de televisão porque chegava na hora e ramelava. Então só tem cara biruta.

Quantos vão ser no total?
Até agora são oito, mas estamos querendo abrir espaço pra mais um. Na verdade esse reality show tá chegando pra arrebentar na internet. As pessoas que acessarem vão gostar porque vão ver situações reais. Não vai ter nada montado, a casa tá toda personalizada, tá escrito “realidade sem edição”, “pede pra sair”… Tem uma televisão enorme, de 32 polegadas, que tá escrito “não ligue a TV” – quem ligar a TV já é eliminado…

[Risos]
Quem brigar a gente vai acorrentar até fazer as pazes. Então isso vai ser a ante-sala do inferno. A gente vai fazer o possível, inclusive eu como apresentador, pra botar fogo um contra o outro de uma forma sutil. O uso do banheiro é condicionado a uma vez por dia por pessoa. Ela pode ficar meia hora lá, fazendo unha, tomando banho, mas é uma vez só. Aí depois da meia-noite pode usar de novo… Quanto mais rápido for eliminando os participantes melhor, porque sobra mais espaço na casa.

Eles estão ganhando algum cachê pela participação?
Tão, mas não posso falar o valor porque é sigilo. Mas vão ter outros prêmios também. O Big Brother dá carro, a Fazenda dá carro novo, né? O Ramelão vai sortear, logo no primeiro dia, uma moto ano 94 com busca, apreensão e documento atrasado. Quem ganhar já vai sair no lucro! Só não pode ser parado pela polícia, senão é apreensão na certa! Só não tem queixa de roubo, agora o resto… [Risos]. Não passou na inspeção veicular porque solta fumaça pra caramba…


A moto chamando para um conserto.

E qual foi seu critério pra escolher todos eles?
Os mais perturbados possíveis [risos]! Alguns eu procurei pela internet, alguns conhecia de vista, outros eu escutava histórias… Fiz uma seleção de mais de 50 pessoas, mas muitos foram eliminados porque não iam dar certo por serem violentos ou por não terem disponibilidade. Algumas até eram de menor [risos]. Tinha uma periguete que tava pra entrar, disse que tinha 19, mas só tinha 17…

Quantas câmeras vão estar monitorando esse povo todo?
Olha… São dois cômodos, então dentro de cada cômodo tem quatro câmeras. E ainda vai ter uma câmera de mão que vai ficar com um rapaz que vai estar 24h dentro da casa trabalhando com ela.

E que tipo de câmera é essa? Webcam?
Não, são câmeras de segurança mesmo.

[Risos].
É que quem tá patrocinando esse evento é uma empresa de segurança de veículos, então ela que instalou. Tem qualidade em HD, são de alto padrão… Então quem acessar os vídeos do YouTube vai ter uma ótima qualidade de imagem, um som perfeito… Mas eu também estou bancando um pouco do meu bolso porque acredito no projeto. Foi tudo bem elaborado. Já venho montando esse reality show há mais de seis meses.


O cativeiro chamando um edredon.

Como vai ser feita a segurança da casa, aliás? O BBB tem um mega muro em volta do cenário, vários seguranças pra evitar que curiosos invadam…
Aqui quem vai fazer a segurança são os cachorros vira-lata. Tem um que é o Negão que talvez seja escalado pra fazer a segurança. A gente tá vendo ainda porque ele é de morder as pessoas, então pra evitar processos a gente tá decidindo. Mas se não for ele vai ser outro vira-lata.

E por que esse nome pro programa?
Ramelão? Foi o seguinte: uns seis meses atrás eu e um amigo meu conversávamos numa padaria e a gente tava falando sobre pessoas que dão mancada, né? Aí o telefone dele tocou. Era um amigo nosso que, inclusive, é um dos participantes, o Júlio, o câmera que sempre dá mancada – esse cara uma vez já tinha pegado uma moto minha e perdido a tampa dela. Só que quando ele voltou disse que não tinha tampa nenhuma na moto [risos]. Enfim, meu amigo atendeu e chamou ele pra tomar umas cervejas na padaria com a gente. Falei: “orra, esse Júlio é mó ramelão! Não chama esse cara aqui não. Ele já perdeu a tampa da minha moto e só fica falando da mulher que corneou ele. Pelo amor de Deus, não chama!”. Só que deu dez minutos e ele chegou. Falei: “porra, você é mó ramelão, bicho. Perdeu a tampa da minha moto e até hoje não pagou.” Ele: “porra, bróder, desculpa aí…” Aí começamos a falar mal um do outro, de brincadeira. Ele falou que minha mulher me traiu com um cobrador de ônibus – pior que é verdade mesmo [risos], mas não a rica, uma outra que eu tive. Nisso veio a ideia: “meu, e se a gente criasse um reality de verdade e colocasse umas pessoas assim. O que um ia falar do outro ia ser um inferno”.

Quanto tempo o programa vai durar?
A princípio até 30 dias. Vamos colocar três vídeos de 10 minutos toda sexta-feira. É uma casa de dois cômodos, banheiro pra fora… Só vai poder comer um marmitex por dia cada um, só vai poder abrir a geladeira quem for líder – e só à noite. Eu acredito que logo no primeiro ou no segundo dia haja alguma desistência, até pra felicidade geral.

Vai ter dias certos pras festas, tipo uma vez por semana?
As festas vão ser todos os dias. Todo dia vai ter festa e todo dia vai ter encrenca, entendeu [risos]? Não vai ter dia determinado pra nada, sabe? Nem pra eliminação. Encheu o saco a gente faz uma perguntinha pirulito-que-bate-bate-pirulito-que-já-bateu e manda embora. Tipo “é melhor você se retirar porque você não tá dando mais.” A gente não tá seguindo o perfil desses programas [outros reality shows] que têm dias certos pras coisas, mesmo porque desse jeito as pessoas ficam se comportando que nem robôs lá dentro, sendo manipuladas e direcionados pra fazer tal coisa. No Ramelão, não. No Ramelão tudo é imprevisível, tudo pode acontecer.

E algum tipo de recompensa pra quem ganhar alguma prova? Do tipo sair pra desfilar não sei onde, dar uma volta…
Olha, a gente tá querendo fazer uma prova que quem ganhar vai ter direito a um dia de faxina; vai limpar a casa inteira, mas sem saber de nada antes. A gente não quer colocar os participantes pra fora pra que eles não se contaminem com o mundo lá de fora, pra que eles não sintam vontade de voltar. Eu quero que a casa seja meio que um aconchego ao mesmo tempo que um inferno. Quero que seja uma coisa maluca, que vai transcender.

Outra coisa que também vai ter na casa é que quando os participantes estiverem dormindo, de madrugada, vai ter uma buzina tipo aquelas de caminhão que vai ser tocada pra acordar todo mundo. Ela vai ficar escondida e, quando todos estiverem dormindo, a gente vai tocar. E essa buzina depois vai ser ‘encontrada’ nas coisas de um dos participantes pra causar um auê na casa. Nós vamos fazer uma coisa surreal. Estamos colocando oito pessoas desequilibradas numa casa, inclusive eu, o apresentador. Pode citar aí! Pra abandonar uma vida de milionário pra voltar a viver numa favela tem que ser um idiota [risos]. Aliás, já estão sendo colocadas duas galinhas dentro da casa também.

Pra quê?!
Vão ficar soltas lá.

Mas pra poder matar e comer?
Não, matar não. Não pode maltratar as galinhas! Elas vão ser mais bem tratadas que eles.

É, podia dar problema com associações protetoras de animais
E a gente vai tomar o máximo de cuidado possível para que as pessoas lá dentro não falem mal de pessoas públicas, de outras emissoras… Pra não rolar nenhum tipo de processo. Eles já receberam um ‘Manual de Morador’ com essas regras.

Como eles vão ser levados pro barraco?
A princípio um vai de bicicleta, outro diz que vinha com o carro de um amigo…

[Risos].
[Risos] Entendeu? Não tem muita frescura mesmo. É na favela; é O Ramelão! Se tivesse um jegue pra trazer todo mundo era até melhor.

E se rolar sexo?
Olha… Se rolar sexo a gente não tem nada contra, entendeu, mas não vai poder jogar no ar. As mulheres vão ser poucas…

Mas tem a rainha dos boquetes.
[Risos] É, tem a rainha dos boquetes, que o Langui parece que falou que já achou gostosa [risos]!

Qual o prêmio pro vencedor?
Ah, o prêmio é mil reais, mas que vai ser pago parcelado.

[Risos].
Mas eles só vão receber essa notícia dentro da casa. Tipo “olha, teve um probleminha com a patrocinadora e esses mil reais vão ser pagos parcelados pro ganhador.”

Pra acabar: você não acha que vai ter gente vendo isso e falando coisas do tipo “que vergonha ficar mostrando o Brasil assim” ou “tinha que ser coisa de pobre mesmo” ou até começar a pensar que todo pobre é “biruta”?
Esse reality não é só para os pobres, mas pra todas as classes sociais. Se houver algum comentário maldoso ou negativo, a gente vai aceitar com muito respeito e sensibilidade. Eu estou dando a cara pra bater como idealizador do projeto. Não tenho medo de críticas, to segurando a responsabilidade, tanto se for um sucesso total quanto se naufragar, que eu vou ser culpado.

POR BRUNO B. SORAGGI
FOTOS DE DIVULGAÇÃO