É comum ouvirmos as pessoas comentarem que as IAs tomarão controle de tudo que é nosso. Até o momento, temos IAs que podem nos vencer em jogos de tabuleiro, na redação de roteiros, na seleção de alvos em imagens de drones e na direção de nossos carros.
A maioria destes sistemas de IA são redes neurais. É uma espécie de arquitetura computacional baseada no cérebro humano. No momento presente, estas redes são compartimentalizadas e otimizadas para lidar com uma única tarefa específica – o que significa que a IA que consegue escrever uma série não sabe dirigir um carro, e por aí vai. São monotasking, digamos assim.
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A ideia é que, um dia, esses sistemas limitados se transformem em uma espécie de inteligência artificial geral (AGI, na sigla em inglês), isto é, um computador capaz de desempenhar uma ampla gama de tarefas tão bem quanto ou melhor que um ser humano.
Ainda assim, a situação das IA levanta uma questão interessante para o neurocientista Zachary Mainen: se um computador passará a pensar como um ser humano, ele teria os mesmos problemas de saúde mental?
Mainen é pesquisador da Fundanção Champalimaud de Portugal e passa boa parte do tempo pensando sobre depressão, um fenômeno relativamente comum que afeta 300 millhões de pessoas pelo mundo e está intimamente ligado ao neurotransmissor serotonina.
Como comentado por Mainen durante apresentação no mês passado durante a Conferência de Computações Canônicas em Cérebros e Máquinas realizada em Nova York, nos EUA, a serotonina é um neuromodulador, um tipo específico de neurotransmissor utilizado para enviar mensagens ao longo de grandes áreas do cérebro.
De acordo com Mainen, pesquisas em torno da serotonina revelaram que esta tem um papel essencial na capacidade do cérebro de se adaptar a situações diferentes.
“As pessoas pensam na serotonina como algo relacionado à felicidade, mas os neurônios ligados à serotonina aparentemente enviam uma mensagem que não é boa ou ruim, mas algo que parece mais como uma surpresa”, comentou Mainem em entrevista à Science após sua apresentação. “Ela parece especialmente importante ao romper ou suprimir crenças datadas.”
Seguindo esta linha de raciocínio, Mainen afirmou que a depressão pode ser encarada como uma incapacidade do cérebro de se adaptar à mudanças. Ele citou como exemplo o caso de alguém que sofreu um sério acidente e se encontra incapaz de lidar com as novas dificuldades. De acordo com Mainen, drogas como inibidores de serotonina ou mesmo psicodélicos como psilocibina podem aliviar sintomas de depressão ao promover plasticidade cerebral.
Inteligências artificiais podem precisar de algum mecanismo de controle embutido semelhante à serotonina no cérebro humano, disse Mainen. Tal mecanismo permitiria às máquinas se adaptarem rapidamente às situações. Por outro lado, também poderiam levar ao enraizamento de certos padrões mentais, resultando em depressão nas máquinas também.
“A psiquiatria computacional presume que podemos aprender sobre um paciente deprimido ou com alucinação ao estudar algoritmos de IA como reforço de aprendizagem”, disse Mainen à Science. “Invertendo a situação: por que uma IA não poderia estar sujeita aos mesmos males que atingem os pacientes?”
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