Algumas das armas apreendidas com os skinheads. Imagens: reprodução RBS TV
Um grupo de nazistas, formado por dois integrantes de Curitiba, um de Agudos do Sul e um de São Paulo, foi preso no começo da semana após desferir um violento ataque a um festival de rock em São Bento do Sul, município de Santa Catarina. A Polícia Civil supõe que eles teriam combinado o ataque remotamente e viajado até lá para a emboscada. A agressão rolou no domingo, dia 12, por volta das 15h30, quando uma das bandas da programação, o Poluição Sonora, chegava de Joinville numa van que trazia ao todo 11 pessoas. Tão logo o veículo estacionou na porta do local do evento, o Cartola’s Bar, a turma foi imediatamente abordada pelos nazis, que já chegaram cercando e distribuindo golpes de faca e machadinha.
Videos by VICE
Os agressores foram levados à Delegacia Regional e, de lá, encaminhados, na tarde do dia 13, ao Presídio Regional de Mafra. Eles permanecerão em cela até a conclusão das investigações. Durante o interrogatório, a polícia confirmou a suspeita de que se tratava de uma ofensiva nazi por conta das tatuagens de suásticas exibidas pelos membros da gangue. Um deles também usava uma camiseta da banda skinhead 4 Skins. A 3ª Vara Criminal do Fórum da Comarca apoiou a decisão do delegado Odair Rogério Sobreira Xavier de manter o quarteto preso. Eles agora vão responder por lesão corporal grave, crime de preconceito racial, richa e associação criminosa. A polícia trata o caso como tentativa de homicídio, diante da natureza da ação.
O relato do Osival Fernandes da Silva, aka Cival Fernandes, vocalista do Poluição Sonora, indica que, caso a polícia não chegasse em tempo, o conflito com certeza teria resultado em mortes. “Nós chegamos, encostamos a van, saímos, algumas pessoas foram pro bar. Não tinha ninguém na rua, só nós. Aí simplesmente os caras vieram do nada, estenderam a mão, e quando fomos cumprimentar eles começaram a desferir as facadas, machadadas, estiletadas, na cara da gente. Não teve tempo de reação alguma. A reação foi simplesmente correr, eu não sabia nem o que estava acontecendo”, descreve.
Fachada do bar diante do qual ocorreram as agressões
Cival levou cortes no lado esquerdo do rosto e na mão direita. Seu amigo, Ederson Fernandes Pariz, ficou com um hematoma no olho direito e recebeu quatro pontos na cabeça. Já o roadie do Poluição, Diogenes Vilmar Wolff, sofreu um corte profundo na lateral esquerda da cabeça até o pescoço. Ele quase teve a sua orelha arrancada por um golpe de machado. O Diogenes chegou a ser internado, mas no momento está de alta em casa e segue bem, se recuperando. Rudinei “Moicano” Pires, vocalista da banda Desordem Crônica, que também tocaria e que foi a organizadora do festival, acredita que os nazis devem ter escolhido este show aleatoriamente, talvez atraídos pela ilustração do cartaz: uma caveira com um moicano e o A de “anarquia” do símbolo do Poluição Sonora. A banda Crowleys também estava no line-up.
A falta de um histórico de movimento anarco-punk organizado na cidade torna mais inesperada a ocorrência. “Há dez anos são organizados eventos de música nesse lugar e nunca aconteceu nada do tipo”, exclama Rudinei. “Nós não somos punks de movimento, nem pregamos ideais políticos, somos uma galera que curte vários tipos de som, mas escolhemos o punk. Gostamos de tocar e nos sentimos felizes com isso.” Conversando com o Cival, nota-se que se trata mesmo de uma galera cuja única bandeira levantada é a da diversão de fim de semana. E que as referências ao punk e à anarquia vêm da estética comum ao hardcore, sem demais pretensões.
“Os caras são nazistas”, diz Cival. “E esses nazistas costumam marcar reuniões entre si e escolher um determinado show. Eles não foram lá procurando especificamente por uma banda. Foram pra fazer o rodo. O que aconteceu é que o pessoal estava tudo lá dentro do bar. Eles atacam com hora marcada. E foi bem quando nós chegamos, às 15h30. Só parou quando o pessoal saiu de dentro do bar e eles fugiram. Deram azar porque bem nessa hora estava passando uma viatura.”
Tatuagens com simbologia nazi-fascista exibidas por um dos integrantes da gangue
Os shows estavam marcados para começar às 16h. A ocorrência teve início na Rua Dom Pedro II. Na fuga, o grupo foi capturado à Rua Henrique Schwarz, próximo à APAE. Os nomes dos agressores divulgados são: Aquiles Gabriel Batista Ribeiro, 18 anos, Jorge Gabriel Gonzales, 25, Douglas de Freitas dos Passos, 26, e Hoann Marcos Gomes, 24. Ainda que os agressores tenham vindo de outras cidades, o pensamento nazista não é coisa nova em São Bento do Sul. Em 2001, chamou a atenção o movimento local Mach Die Augen Auf (“abra os olhos”), dedicado a combater a entrada de migrantes no município, originalmente formado a partir de colônias alemãs e austríacas.
Um dos nazis, Jorge Gabriel, é conhecido das tretas de rua de São Paulo entre anarco-punks e skins. Em 2014, ele pegou 16 anos e sete meses de prisão por duas tentativas de homicídio e uma lesão corporal em razão de uma ocorrência de 26 de fevereiro de 2011, nas imediações do terminal Parque Dom Pedro II, em São Paulo. As vítimas, um grupo de quatro anarco-punks, eram todas negras e foram feridas à faca, com cortes no abdômen, braço e testa – golpe que chegou a perfurar o crânio e atingiu o cérebro de uma delas.
Á época, Jorge já contava com uma condenação em primeira instância por injúria real, tendo cumprido quatro meses de detenção. Quando preso em 2011, uma das armas que ele portava apreendidas pela polícia era uma faca com a inscrição nazista “88” (ou seja, uma referência à pronúncia “HH”, da saudação “Heil Hitler”) e o nome da facção nazi-skin paulistana Impacto Hooligan. Ele também foi apontado como suspeito de participar de um atentado a bomba contra participantes da Parada Gay de São Paulo, em 2009.
Armas em posse do quarteto
Tatuagem com a suástica nazista
Aquiles Gabriel Batista Ribeiro, 18
Douglas de Freitas dos Passos, 26
Hoann Marcos Gomes, 24
Jorge Gabriel Gonzales, 25