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Música

Discos: Vários

Acordes arrancados de corpo e alma à guitarra ou ao banjo.

Imaginational Anthem Vol. 6: Origins of American Primitive Guitar

Tompkins Square

Eis mais um capítulo da fascinante e sempre incompleta história da guitarra, e dos seus mestres, muito antes da electricidade lhe ter conferido a alma diabólica que mais tarde abriria portas ao rock e seus derivados. Bem sei que heróis há muitos, mas estes certamente antecedem todos aqueles que nos ocorrem à priori. A narração sonora pertence à Tompkins Square, editora maravilha de Nova Iorque. O volume 6 da série

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Imaginational Anthem

 acrescenta uma mão cheia de valiosos nomes às edições anteriores e apresenta-se como uma espécie de artefacto moderno, daqueles indispensáveis a um bom coleccionador ou a um mero melómano. Na realidade, temos entre mãos uma jornada à década de 1920 pela América profunda e às raízes do

blues grass

. Quantas vezes não escutámos já o chavão "já não se faz música assim" na ponta da língua de uma geração distante da nossa? Pois neste caso, essa gente de boa memória tem efectivamente razão; ainda que estas obras possam ser evidentemente reinterpretadas, existe todo o contexto de origem histórica, impossível de reproduzir com tamanha genuinidade — e que obviamente torna esta compilação tão única.

Se é verdade que John Fahey, Robbie Basho ou Sandy Bull são hoje referências maiores e inquestionáveis na arte do

fingerpicking

, essa técnica ecoa, ainda de um modo discreto, ao longo do disco. Factualmente menos espiritual e trans-fronteiriça que os caminhos abertos por essas iluminárias, a visão blues de

Imaginational Anthem

é tão crua quanto tocante; ou para usar o próprio termo do seu sub-título, "primitiva". Para além das invulgares harmonias, ressaltam rudes acordes arrancados de corpo e alma à guitarra ou ao banjo, relevando a mais pura transcendência (e até confidência) entre o homem e o instrumento — uma relação obviamente sagrada. Distante da cidade e das multidões, é num espaço mental de uma qualquer planície ou montanha, junto ao rio ou ao pântano, que a força motriz desta música se desenrola. Aliás, só podia ser assim.

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Os bravos do pelotão soam pouco sonantes para a maioria, assumindo o injusto papel de ilustres desconhecidos como Sylvester Weaver, Riley Puckett ou Davy Miller, o ex-soldado cego. Os seus legados e biografias apresentam-se, infelizmente, incompletos ou inalcancáveis mesmo usufruindo de todo o espólio de sabedoria e conhecimento da web. É então nesse momento que a existência dos

booklets

nos podem dar uma ajuda preciosa no descortinar das identidades e percursos de vida (e neste caso isso faz todo o sentido). Claro que esta informação será sempre importante, no sentido de entender melhor o homem por detrás da voz. Porém, é a própria música e as histórias que nela habitam que melhor transporta a essência de cada um. Quanto a isso,

Imaginational Anthem Vol. 6

 é um brutal monumento que atravessa largamente o espectro do mero blues. E esse é apenas um meio quase singular de deixar bem claro a todo o mundo que há muito para escutar e aprender vindo de seis cordas e uma voz.