Se você é jovem ainda, vamos ser francos, a única coisa que tem na sua geladeira são algumas cervejas que você comprou na promoção do mercadinho – naquela ala com etiquetas alarmantes para avisar que tudo ali está próximo do vencimento, inclusive sua vida, seu saldo bancário, sua esperança de um país melhor. É bem provável que você já tenha se desafiado a tomar todas antes de passar o prazo dos rótulos porque algum adulto lhe ensinou na infância a não consumir nada vencido. Foi responsável da sua parte. Mas você deve ter sacado também que entornar o copo quase todo dia pra fazer valer a pena essa graninha pode te dar uma ressaca desgraçada no dia de amanhã, né? Então vamos aqui te contar um segredo: pode beber cerveja vencida sem culpa.
Segundo os médicos, é muito raro alguém ter intoxicação alimentar ou ter qualquer problema sério por ter tomado aquela cervejinha do mês passado que estava no fundo da geladeira. “Nunca vi casos de intoxicação alimentar com cerveja”, garante o secretário geral da Federação Brasileira de Gastroenterologia, Dr. Ricardo Babuti. “O que acontece é que quando você consome cerveja vencida, ela está choca”, lamenta o médico.
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A diretora do Instituto da Cerveja Brasil, Khatia Zanatta, é mestre cervejeira e sommelier. Ela explica que aquela cerveja mainstream do supermercado é muito sensível, então, com o tempo, ela oxida. Quando vencida, ela fica com aroma de papelão e amargor desagradável. Ou seja, bem ruim. “Fica aquela cerveja que não desce mais muito bem, com gosto de cerveja velha. Não vai fazer mal, mas ela não vai ser tão fresca e refrescante como ela deveria ser”, diz.
Há uma explicação científica para a bebidinha fora do prazo não fazer mal. O Dr. Babuti explica que o álcool das cervejas de fato impede a proliferação de bactérias que causam problemas à saúde. O cuidado, diz ele, deve ser tomado com bebidas destiladas – como vodkas, pingas, coquetéis nucleares etc. – produzidas sem fiscalização porque não se sabe a origem daquilo que foi colocado na garrafa. Não tem como saber se o produto foi contaminado, afirma.
A sommelier garante que as propriedades químicas da cerveja, como o pH baixo, o meio anaeróbico, a presença do álcool e do lúpulo, fazem com que nada de ruim se prolifere na bebida e gere consequências ruins à saúde. “A data de validade é meio que um parâmetro mais relacionado ao perfil sensorial da cerveja pra que ela fique dentro das características propostas pelo fabricante, que o aroma esteja ainda como ele deseja, o sabor, o brilho”, afirma. A dica dela é que quanto mais fresca a cerveja, melhor o gosto.
Algumas cervejas especiais, no entanto, são feitas para beber depois de muitos anos guardadas. Ela mesma conta que já experimentou cerveja de 50 anos de idade. “Estava ótima, maravilhosa e eu estou aqui firme e forte”, brinca. Era um estilo de cerveja conhecida como Borgonha da Bélgica que, quanto mais envelhecida, melhor. “Ao longo dos anos, naturalmente acontecem inúmeras reações químicas dentro da cerveja e que vão mudando o perfil sensorial dela, o aroma é modificado, o sabor, o corpo”, conta.
Mas como saber exatamente o dia que a cerveja perderá suas deliciosas propriedades? A resposta é: depende dos testes. O que determina o prazo de validade, segundo a nutricionista da Associação Brasileira de Nutrição, Dra. Aline Pereira, é a composição do alimento ou da bebida. “Quando você põe o prazo de validade num produto, isso tem que ser testado. Chama-se teste de prateleira. Antes de um produto ir para o mercado com um prazo de validade, ele passa por análises químicas e dentro dessas análises, tem esse teste, para saber quais são as bactérias que podem conter naqueles alimentos, quanto tempo elas duram”, diz.
Consumir qualquer produto fora do prazo, diz a especialista, pode dar intoxicação alimentar e, em alguns casos de consumo de alimentos vencidos, levar ao óbito. Por isso, mesmo a cerveja sendo segura por causa de seu álcool, a indicação dos médicos é que se consuma antes de vencer. É o famoso “nunca se sabe”. “À medida que o tempo passa, o álcool vai evaporando, aí esse efeito bactericida pode desaparecer na cerveja. De repente, você pode ter contaminação bacteriana e pode haver risco de intoxicação”, explica o Dr. Babuti. “Perto de todos os produtos, é muito raro, mas pode existir.”