O que diabos aconteceu com Taribo West?

Taribão, o mito, antes de virar pastor. Foto: PA Images

Na maior parte do tempo, jogadores de futebol são indivíduos bem comuns. Não é surpresa nenhuma, convenhamos. Desde que nasceram, esses caras não fizeram muita coisa além de sair chutando uma bola por aí – e ouvir gente barriguda falando sobre as complexidades de chutar uma bola por aí.

Taribo West sempre foi diferente. Quando era jogador, o zagueiro nigeriano usava tranças coloridíssimas no cabelo e figurou em uma série de clubes esquisitos; depois, aposentado, ele se tornou pastor cristão e fundou o Ministério dos Milagres de Todas as Nações Abrigo na Tempestade. Não dá pra imaginar, sei lá, o David Luiz, outro beque meio religioso com juba extravagante, fazer o mesmo. West tinha algo a mais.

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Tormentos esportivos

San Siro, Stade Abbé-Deschamps, Pride Park. Por todos os locais que passava, West se tornava um ídolo. Suas tranças, que muitas vezes batiam com as cores dos clubes em que jogava, viraram uma marca registrada do futebol dos anos 90 e 2000.

Embora o visual às vezes ofuscasse seu futebol competente, a carreira do nigeriano é bem vitoriosa. Depois de iniciar na Nigéria, West passou pelo Auxerre e o gigante Inter de Milão. Por esses clubes conseguiu um título da Ligue 1 (a francesa, ok) e foi campeão da UEFA com o time italiano.

Na temporada seguinte, foi para o inglês Derby County e ajudou o clube a se manter na Premier League. Mais tarde foi para o Kaiserslautern, na Alemanha, e então passou por times na Sérvia, Catar, jogou no pequenino Plymouth Argyle, da Inglaterra, e encerrou a carreira com algumas partidas na Nigéria e outras no Irã. Aposentou-se em 2008.

Pela seleção, West fez 41 jogos e ganhou o ouro olímpico de 1996. Ele também jogou em duas Copas do Mundo, 1998 e 2002. Foi uma trajetória bem bacana, ainda que marcada por acusações de que ele não estava sendo honesto sobre sua idade.

Em todo o tempo que esteve nos gramados, West ouvia de torcedores, críticos e jornalistas que ele era gato. E isso, na linguagem futebolística, você deve saber, não é um elogio.

West enfrenta Paulo Wanchope pela posse de bola. Caralho, 2001 foi um baita ano para se estar vivo e assistir futebol. Foto: PA Images

A vida após o jogo

Foram-se as tranças. Não chega a ser uma surpresa. Não é de bom tom, afinal, um pastor do Ministério dos Milagres de Todas as Nações Abrigo na Tempestade usar tranças coloridas enquanto espalha a palavra de Deus. E de que cor seriam, não é mesmo? Que tom melhor representa um ex-jogador que virou pregador evangélico? Talvez essa seja uma pergunta complexa demais para o próprio ex-zagueiro.

Taribo West agora espalha a palavra de Deus em tempo integral. Não é exatamente um absurdo – ele fundou seu primeiro ministério nos subúrbios de Milão enquanto jogava pelo Inter e o manteve quando se mudou para a Inglaterra. Ele até mesmo convenceu o técnico inglês do Derby County, Jim Smith, a lhe dar os domingos de folga para voltar à Itália e pregar. “Tínhamos um acordo de cavalheiros”, revelou o antigo chefão do Derby posteriormente. Big Jim gostava de agradar Taribo sob o argumento de que a atuação na zaga havia lhe garantido certas liberdades.

Mas, se formos um pouco mais fundo no passado, parece que a caminhada de West às glórias do Ministério não foi livre de percalços. Ele afirmou, antes de encontrar Deus, ter praticado juju – por vezes considerado uma espécie de bruxaria – usando uma série de amuletos e afins para lhe dar sorte antes dos jogos.

“Nos dias em que jogava, quando era ignorante, pedia que alguns mallams e babalawos (médicos tradicionais) criassem amuletos para nós, que levávamos ao campo”, disse ao jornal nigeriano The Punch.

Além da inconveniência óbvia de se jogar futebol com um amuleto na meia, a prática também não pegava bem com Patience Ikemefuna, pastora e conhecida de West que por vezes se refere a ela como sua irmã. Falando com Jonathan Wilson do The Guardian em 2002, West revelou que uma visita dela mudou sua vida. Abaixo, um parágrafo do relato:

“Abri a porta e, antes que tivesse a chance de dizer que estava feliz em vê-la, ela disse: ‘você deve ser forte para morar em uma casa como esta’. Ela me falou que a casa tinha uma aura ruim e perguntou que tipo de rituais eu conduzia ali. Se não fosse minha irmã, teria expulsado na hora. Como muitos jogadores, eu era muito supersticioso e, antes de cada jogo, acendia uma vela e segurava uma pedra mágica que um amigo havia me trazido de Israel. Minha irmã disse que sentia energias ocultas e que via dois cães – um branco e outro preto – brigando pela casa”.

Ela o convenceu de que precisava mudar. De acordo com Taribo, tudo começou a ficar estranho. Gavetas se abriam e fechavam sozinhas.

“Pensei que podia ser o vento, mas ao passo que esse pensamento entrou na minha cabeça, todas as portas começaram a bater também. Parecia coisa de filme ruim, mas eu sabia que era real. Senti um calor por dentro e então minha irmã disse: ‘Taribo, você se tornará um pastor também’”.

Há ainda relatos da amante de Taribo se transformar em uma serpente, mas, dada a falta de fontes, não pudemos incluir aqui como nada além de um rumor bizarro.

O que podemos afirmar é que a visita de Ikemefuna levou West a se converter e fundar sua primeira igreja. Apesar de ainda estar na ativa em uma das principais ligas europeias, ele se dedicou à nova vocação e logo deixou o juju de lado.

West trabalha hoje no principal centro financeiro nigeriano, Lagos. Ele fundou seu atual ministério em 2014 depois de deixar sua vida como boleiro para trás e se dedicar à obra Divina. Sua função é pregar pelos guetos e pelos mercados lotados da cidade.

“O evangelho é para os pobres, ricos e nobres”, disse no ano passado. “Parte do dom que Deus me deu é alcançar os injustiçados. É bom chegar a eles, pregar a palavra e tentar ajudar com algumas de suas necessidades por meio de serviços humanitários. Sou grato a Deus por me usar para espalhar o evangelho entre essas pessoas.”

O ex-zagueiro também lidera alguns serviços em Lagos – e ele não deixa de usar sua antiga carreira para impulsionar a nova. Como pode se ver no anúncio de um evento do ano passado, abaixo, as imagens de Taribo com trancinhas ainda têm apelo comercial.

Casos semelhantes

O ex-jovem promissor do Manchester United, Phil Mulryne, que jogou mais de 150 vezes pelo Norwich City, começou o seminário em 2009. Um curso de filosofia de 2 anos de duração em Roma e outro de teologia de 4 anos se seguiram. A expectativa é que ele vire padre em 2016. Parece um pouquinho mais rigoroso do que o West passou para ganhar suas credenciais de pastor.

Chances de retorno

Por mais improvável que pareça, não é impossível que West volte ao jogo em algum ponto. Ele segue bastante ativo quando se trata da seleção nigeriana. Muitas vezes ele dá entrevistas que combinam religião e análise da performance do time. Caso uma vaga surja, ele poderia voltar ao jogo. E tocar também o seu Ministério, claro. São carreiras complementares, não é?

Ficaríamos empolgadíssimos em ver o Pastor West espalhando o Evangelho dos Carrinhos para uma nova geração de zagueiros nigerianos. Quem sabe alguém até herde as tranças.

Tradução: Thiago “Índio” Silva