Os termômetros da Avenida Paulista marcavam 29º, o sol a pino, baterias, bandeiras e muitos black blocs. Foi assim que começou o “Primeiro Grande Ato Contra a Copa do Mundo” em São Paulo, em pleno aniversário de 460 anos da cidade. Protestos similares aconteceram em outros cantos do país. Dilma Rousseff, nossa presidente, era alertada pela galera, que cantava: “Ô, Dilma, vê se me escuta. Na Copa vai ter luta”. Mas ela sabe disso. Não à toa, o treinamento antiterrorismo durante os jogos aparenta estar muito bem ensaiado.
Não é de hoje que muita gente está puta da vida com a realização da Copa no país. A reclamação generalizada é de que os gastos monstruosos na construção de estádios e infraestrutura para receber um evento desse porte no Brasil acabam prejudicando os investimentos nas calamitosas áreas sociais. Provavelmente, teria sido mais efetivo protestar antes da decisão do país em sediar o evento, mas sabe como é… Tentando acalmar os ânimos, o governo lançou um site chamado Copa Transparente para divulgar os gastos públicos. Acontece que, para conseguir entender como a parada funciona, você precisa tirar um diploma de especialista.
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Dois mil homens da Polícia Militar amparavam os 1.500 manifestantes, que andaram da Paulista até o Centro. Assustados com a multidão, lojistas e donos de bares baixavam as portas. Homens fardados escudavam todas as agências bancárias que vimos pelo caminho.
“Uh, uh, uh, uh, uh.” Era com esse som, que beirava o animalesco e dava até um medinho, que os black blocs, de braços dados na linha de frente da marcha, avançavam pelas ruas de São Paulo. Tudo ia muito bem. Nenhuma parede pixada, nenhum lixo incendiado. E duas coisas eram curiosas: de junho para cá, os então silenciosos BBs, agora entoavam gritos. “Ih, fodeu, o black bloc apareceu.” Além do mais, numa paciência praticamente budista, o grupo esperou 6 km de caminhada para dar início ao quebra-quebra. O primeiro alvo, que parecia ser um amontoado de lixo incinerado, surgiu para a multidão junto com a presença da Tropa de Choque quando o céu já estava escuro. A partir daí a merda estava feita.
A marcha ia pela Rua Augusta quando os BBs tomaram um busão vazio, quebraram os vidros de uma concessionária e depredaram várias agências bancárias pelo caminho. Não demorou cinco minutos para que as bombas de gás lacrimogêneo pipocassem pela rua. Corre-corre, lágrimas, gritos, desespero. Eu e Alice Martins, a fotógrafa, tentamos nos proteger na porta de um hotel. Um molequinho de mais ou menos 13 anos, acompanhado pela mãe, começou a entrar em pânico do nosso lado. Depois de inalar certa quantidade de gás lacrimogêneo, todo mundo perdeu um pouco a direção. Por insistência da Alice, vazamos. Se pá, sorte. Minutos depois, manifestantes e jornalistas que ali estavam foram presos. Depois, ela retornou ao local para fotografar o momento em que as pessoas foram detidas.
A correria continuou e a multidão se dispersava pelas ruas da Bela Vista e pelo Centro. Passei pela rua da Consolação e vi um fusquinha detonado. Dizem que os BBs atearam fogo nele. Dizem também que a roda do carro ficou presa a um colchão em chamas, daí o fogaréu. Um jovem de 22 anos levou três tiros. Segundo o B.O., ele foi atingido por PMs depois de resistir à prisão por portar coquetel molotov. Ontem, o Twitter da Polícia Militar anunciou que 128 pessoas foram detidas para averiguação. Ligamos para confirmar a informação com a Secretaria de Segurança Pública hoje e fomos informados que, no total, 135 pessoas foram presas. Entre elas, 12 menores. Ninguém permanece detido.
E, como diz o nome do evento divulgado pelo Facebook, foi só o “Primeiro Grande Ato Contra a Copa”. Colaremos nos próximos. E, provavelmente, serão muitos.
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Dá uma sacada no nosso documentário sobre as manifestações de junho: