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Entretenimento

Lá na província há "Materiais Diversos" e um "Acaso" que não podes perder

Num tempo em que se perdeu a vergonha e quem pode usa os mass media para meter em marcha agendas próprias, é nas alternativas que ainda se encontra algum sossego.
O "clown" Rui Paixão, no Festival Acaso. Foto por Paulo Pimenta

Num mundo temporal não muito distante do de hoje, a nova música do Beck seria um êxito mundial, porém underground na mesma, veja-se o paradoxo. Hoje, será só mais uma boa canção entre a enxurrada de informação que nos chega todos os dias.

Há muito que a erudição e a cultura popular se complementam uma à outra, as margens passaram para o centro, o centro foge para as margens e o sentido de "lá na província" deixou há muito de fazer sentido, pelo menos num plano figurativo que alguns ainda, numa qualquer pândega caduca, teimam em perpetuar.

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Num tempo em que se perdeu a vergonha e quem pode usa os mass media para meter em marcha agendas próprias, ou seja, sistematicamente contra tudo o que venha de determinado sítio que não alinhe com "a situação", é nas alternativas que ainda se encontra algum sossego.

Assim, do centro para fora, a produção de várias disciplinas contemporâneas, nomeadamente dança, teatro ou música, tem conhecido novos territórios, não só na sua exploração, mas também na forma como e onde se apresenta ao público.

O Festival Materiais Diversos, actualmente na sua sétima edição, com epicentro em Minde, localidade situada a pouco mais de 40 quilómetros (a Sul) de Santarém, ou de Leiria (a Norte), de Alcobaça (a Oeste) ou de Tomar (a Este), conta também com uma programação regular de proximidade ao longo do ano em Torres Novas, Alcanena e Cartaxo e está integrado numa rede de produção e difusão a nível europeu.

Nesta localização privilegiada, o evento em si estende-se a Torres Novas e Alcanena, e até ao momento já levou a cabo a estreia de Projecto Espiões, de Filipa Francisco, com Francisco Camacho, Miguel Pereira e Sílvia Real. Peça que segue para Lisboa, de 30 de Setembro a 2 de Outubro, no Teatro Maria Matos.

Na área da dança/performance, o Teatro Virgínia, em Torres Novas, recebe Catarina Miranda, do colectivo SOOPA, que apresenta, em modo première, Boca Muralha, "o último momento de REI, uma trilogia de peças de dança que aborda o exercício da violência e do poder, que a bailarina desenvolveu entre 2015 e 2016". É hoje, 22 de Setembro.

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Já, Habrás de ir a la guerra que empieza hoy, de Pablo Fidalgo Lareo, chega sexta-feira, 23, à Fábrica de Cultura de Minde. Já passou em 2015 pelo Porto, Coimbra, Lisboa e Lagos, foi considerada como uma das peças de teatro do ano e, tal como o Natal, continuará a ser enquanto e quando quisermos. A memória é a principal oposição à opressão, pois a habitual história dos vencedores nem sempre é como a contam. Imperdível.

Habrás de ir a la guerra que empieza hoy, de Pablo Fidalgo Lareo, no Materiais Diversos. Foto por Marta Pina

Um pouco mais acima, em Leiria, o Festival Acaso decorre entre os meses de Setembro e Outubro e também se estende por diversas localidades, nomeadamente nos concelhos de Leiria, Batalha, Marinha Grande, Ourém, Pedrógão Grande e Santarém.

A sua XXI edição diz-nos que é já um exemplo de continuidade, mas também de luta e teimosia, não fossem estas duas décadas de evento sempre recheadas de peripécias e orçamentos curtos. Muito curtos. Do sagrado, ao profano, há de tudo um pouco.

Neste festival, o grupo organizador, O Nariz Teatro de Grupo, estreia S. Paulo, uma leitura encenada no imponente Mosteiro da Batalha e, ao longo destes dois meses teremos também o projecto do clown Rui Paixão, Teatro dos Aloés, Teatro Instável, Companhia da Esquina, Malier Teatro, Teatro Extremo, Papillon, Escola de Teatro Anrique da Mota, Filipe Crawford, Jorge Serafim (como contador de histórias), Trio JER, Birds Are Indie, ou Fatzilla, na música, entre outras propostas, numa programação bastante rica.

A ironia e o nonsense também fazem parte, com o momento alto no encerramento do Festival, com Reconstituição histórica da vida noturna numa discoteca dos finais do século XX, uma ideia arquitectada pelo não menos chanfrado músico/performer, António Cova.

São duas propostas que fazem parte da definitiva rentrée, onde, a par dos circuitos habituais, há um país que pulsa e compete com os horários dos programas desportivos na televisão - sagrados -, em que nunca se interrompe para notícias de última hora, nem para um discurso na ONU, por exemplo. Alguém falou em provincianismo?