Há gajos que a sociedade gosta de catalogar como bons exemplos. No entanto, se os escuteiros ou o pessoal do coro evangélico te deixam com a pulga atrás da orelha, quero sensibilizar-te para outros géneros igualmente inquietantes.
O screensaver do Hermann Nitsch.
O lamechas
Estou a falar dos apreciadores de termos como “fofinho”, “bebé”, “baby”, “amorzinho”, “beijinhos”: qualquer coisa que termine em “inho” e que permita reduzir-te a um estado pouco ameaçador. Há quem veja o mundo através de lentes cor-de-rosa, mas estes gajos vêem-no por meio de lentes tilt shift e fica tudo do tamanho de legos. A interacção social com estes porreiraços é como cair dentro da toca do coelho — vai-se desaguando em vários níveis. Nos primeiros, encontras-te naquele tipo de situação em que a pessoa, que não conheces de lado nenhum, é super afável, parece que já te conhece há anos e que roça um bocado o histérico.
Nesta situação, vais cair na tentação de ser mais simpático do que consideras razoável e, quando deres por ti, estás a chafurdar na hipocrisia. Acontece rápido e sem aviso, tipo uma moca de ácido. Caso não te deixes levar e mantenhas uma postura normal, vais induzir uma desfeita no porreiraço e o ambiente vai ficar tão desconfortável como fazer uma viagem Porto-Botswana sem Xanax, de fio dental e calças de couro City Jeans.
Nos últimos níveis, chegaste ao fundo da toca, ou seja, estar com este pessoal parece uma odisseia estilo Enter the Void, mas em vez de levares com strobes e néones do red-light district de Tóquio, entras num mundo onde és ofuscado por miúdas Harajuku, fotos da Anne Gueddes, ursos agarrados a corações e gatinhos rodeados de cerejas — uma referência subliminar ao desejo reprimido de visitar sites ilegais de Manga, onde criancinhas são violadas por extraterrestres com pinta de moluscos. Por isso, reduz a tua proximidade a estes espécimes, a menos que aprecies a erotização de cefalópodes.
O reabilitador
Dos Estados Unidos importamos não só a política neo-liberal e os ZZ Top, como também o não menos eficaz modelo de clínicas de reabilitação. “Deus, dá-me força para aceitar aquilo que eu não posso mudar” é um disco de platina nas tabelas de clínicas espalhadas por esse mundo fora, onde te tentam convencer de que entoar isto de mãos dadas e em círculo vai mudar-te a vida. Estar nos Narcóticos Anónimos pode ser comparado à praxe na faculdade — até há padrinhos e madrinhas —, mas sem a parte das tequillas e do vomitado. O franchise dos 12 passos é, alegremente, abraçado pelos ex-adictos e, geralmente, leva-os ao 13.º passo: voltar a dar umas valentes cavalgadas.
O apreciador dos Bon Iver
Sabem aquele vídeo 2 Girls 1 Cup, com a fantástica sequela 1 Man 1 Jar? São uns aprendizes do masoquismo ao lado de quem curte isto. Fica o aviso de que o visionamento destes vídeos — do segundo em particular — é apenas para o estômago de quem ouve Bon Iver com regularidade, pois atinge níveis de porreirice dificilmente suportáveis por pessoas vulgares.
“Os touros passam na RTP e nós não. Porquêeeeee?”
O jogador de râguebi
Esta alínea está um pouco desfasada do artigo, porque eles não têm pretensão de serem porreiros — toda a gente sabe que encontrar um/a gajo/a fixe no râguebi é como procurar urânio no Alasca. Já há cientistas a fazerem estudos sobre isto inclusive, andam pelo Clube Desportivo Universitário do Porto à procura de um jogador que não seja um beto com a puta da mania, porque valem mais que plutónio. De qualquer forma, deves evitá-los a todo o custo porque eles reagem às pessoas como os touros àqueles panos vermelhos — gostam de lhes espetar com os cornos.
O padre
Em questões de porreirice, nada bate um bom padreco. Se Deus tivesse um telemóvel de terceira geração, o padre seria o Twitter e o crente seria a pessoa perspicaz que perde tempo a ver frases numa rede social tão útil como um pager. Há que ter em consideração que se trata de um humano com poderes extra-sensoriais que lhe propiciam um contacto directo com a divindade e, como tal, tem de se diferenciar de nós, comuns mortais — com toda a humildade, claro. Para tal, falam com muitas parábolas e não subestimam o poder da batina, do cálice e da água benta — da mesma maneira que o P. Diddy não subestima o poder de um Rolex, de um Bentley e de um Crystal (champanhe, neste caso).
Videos by VICE
Depois, tentam renegar aquilo que quem não ouviu o chamamento adora fazer: foder. Sabem quando estão num after e recebem um telefonema da vossa mãe? São o tipo de chamadas que um gajo deve ignorar. É um facto irrefutável e cientificamente comprovado — o impulso sexual não existe num padre. Da mesma forma que não existem rabetas no Irão e comunas nos Estados Unidos. Mas, apesar disso, consideram-se uns poderosos conselheiros matrimoniais, baseados na sua vasta experiência como punheteiros recalcados e em escapadelas pedófilas. Portanto, segue o meu conselho: esquece todo o tipo de guias espirituais e lê antes os guias da VICE. Ficas mais iluminado, prometo.
O guru new-age
Estes maiorais leram A Cura Quântica do Deepak Chopra e ficaram, subitamente, mestres nas leis da física e da forma como esta descreve o funcionamento do universo. O guru, tal como o padre, gosta de se diferenciar dos comuns mortais. Por isso, normalmente andam vestidos com uns balandraus às cores e têm um ar simpático, de quem se preocupa com o estado da humanidade e com o facto de termos um cabrão de um buraco negro que nos vai engolir a todos. Eles não andam a dormir, até podem não perceber nada do princípio da incerteza de Heisenberg, mas sabem que a maioria do pessoal também não. Por isso, apropriam-se de termos científicos aleatórios e misturam tudo.
Depois vão fazer palestras para o Boom Festival sobre o “entrelaçamento subatómico da consciência quântica divina não-local” e de como os cientistas são uns gajos com mente fechada, incapazes de ver a verdade, mas a tua sorte é que eles não só a descobriram, como a têm pronta para ser revelada. Se quiseres parar com este pessoal, vais ter de desistir dessa coisa trabalhosa que é tentar fazer sentido: quanto mais rebuscado parecer o teu discurso, melhor. Queima os DVDs do Carl Sagan e os livros do Dawkins! Quem é que precisa de lógica quando há resmas de gajas boas em festivais mortinhas que as enfies na quinta dimensão?
Sobreviver em comunidade
Viver em democracia é bonito, é um mundo em que monárquicos coabitam com republicanos, violadores com violados e especuladores da bolsa com nações falidas. Partilhamos este planeta perdido numa dos biliões de galáxias localizadas num universo em constante expansão. Somos todos uma grande família feliz — tipo aquela do Feios, Porcos e Maus, em que o chefe de família incendeia a casa no final — e quando alguns dos nossos porreiros fizerem esta nossa casa arder, esperemos que o pessoal em Vega esteja registado no couchsurfing.org.