Ecossexuais acreditam que transar com a Terra pode salvá-la

Uma participante do Ecosexual Bathhouse do grupo de arte Pony Express. Foto por Matt Sav.

Esta matéria foi originalmente publicada a VICE US.

Quem estiver em Sydney, na Austrália, neste começo de novembro tem a oportunidade única de fazer sexo com a Terra. Você só precisa dar uma passada na “ecosexual bathhouse“, uma instalação que atualmente faz parte do festival de arte experimental LiveWorks de Sydney. A casa de banho é uma instalação interativa criada pelos artistas Loren Kronemyer e Ian Sinclair da Pony Express, que descrevem a obra como “uma festa sem barreiras que visa dissolver os limites entre as espécies enquanto caímos no esquecimento” como resultado da crise ambiental global. Mas eles também veem a obra como parte de um movimento ecossexual muito maior que, segundo eles, está ganhando impulso no mundo todo.

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E eles podem ter razão. Jennifer Reed, candidata a PhD em sociologia da Universidade de Nevada, em Las Vegas, nos EUA, está escrevendo uma dissertação sobre a ecossexualidade, e diz que o número de pessoas que se identificam como ecossexuais cresceu muito nos últimos dois anos.

E uma pesquisa de dados no Google confirma que o interesse pelo termo disparou dramaticamente no último ano. No futuro, podemos ver 2016 como o ano em que o a ecossexualidade chegou ao mainstream.

Ecossexualidade é um termo com definições amplas, que variam dependendo de quem explica. Amanda Morgan, membro da Escola de Ciências da Saúde da UNLV, que está envolvida no movimento ecossexual, diz que a ecossexualidade pode ser medida com algo parecido com a Escala Kinsey: num extremo você tem pessoas que estão tentando usar produtos sexuais sustentáveis, que gostam de nadar peladas em rios, etc. Do outro, “pessoas que rolam na terra e têm orgasmos”, ela diz. “E tem gente que transa com árvores ou se masturba embaixo de cachoeiras.”

Participantes do Ecosexual Bathhouse do grupo de arte Pony Express. Foto por Matt Sav.

O crescimento do movimento deve muito aos esforços das artistas performáticas, ativistas e casal de São Francisco Annie Sprinkle e Elizabeth Stephens, que fizeram da ecossexualidade uma cruzada pessoal. Elas publicaram um “manifesto ecosex” em seu site SexEcology e produziram vários filmes sobre o tema, incluindo o documentário Goodbye Gauley Mountain: An Ecosexual LoveStory, que retrata um relacionamento “polém-amoroso” entre elas e as Montanhas Apalache. E enquanto faziam a turnê da peça de teatro Dirty Sexecology: 25 Ways to Make Love to the Earth, elas realizaram cerimônias de casamento nas quais elas e colegas ecossexuais casaram com a Terra, a lua e outras entidades naturais.

Sprinkle e Stephens falam abertamente sobre ecossexualidade como uma nova forma de identidade sexual. Na parada gay de São Francisco ano passado, elas juntaram 100 colegas ecossexuais numa cerimônia para “oficialmente” acrescentar um E à sigla LGBTQI; Stephens disse a disse a Outsider que elas acreditam que há pelo menos 100 mil pessoas no mundo que se identificam abertamente como ecossexuais.

Um trailer do “Ecosexual Bathhouse” do Pony Express

Segundo a pesquisa de Reed, o termo “ecossexualidade” existe desde o começo dos anos 2000, quando começou a aparecer em descrições de perfil de sites de namoro. Mas foi só em 2008 que o conceito começou sua evolução para um movimento social completo, quando Sprinkle e Stephens começaram a oficializar casamentos ecossexuais. As duas artistas são ativas no movimento de casamento igualitário, e querem canalizar essa energia para causas ambientais. Stephen disse que o objetivo delas é reconceitualizar a maneira como olhamos para a Terra: em vez de ver o planeta como uma mãe, deveríamos vê-lo como um amante.

Também em 2008, StefanieIris Weiss, escritora e ativista que vive em Nova York, começou as pesquisas para seu livro Eco-sex: Go Green Between the Sheets and MakeYour Love Life Sustainable, publicado em 2010. Weiss, que na época não conhecia o trabalho de Sprinkle e Stephens, inicialmente deu à ideia uma abordagem mais prática e literal, pesquisando os danos ambientais causados por materiais usados em camisinhas, lubrificantes e outros produtos sexuais. Ela disse que escreveu o livro para ajudar as pessoas a tornarem sua vida sexual “mais carbono neutro e sustentável”, e ajudar a evitar poluir nossos corpos quando fazemos sexo.

O desejo por produtos sexuais mais seguros e sustentáveis continua uma parte importante do movimento ecossexual, e Weiss disse que opções ecológicas para os consumidores aumentaram muito desde que ela escreveu o livro. Mas ela também abraçou a tomada mais holística da ecossexualidade de Sprinkle e Stephens, reconhecendo imediatamente nos esforços delas um objetivo compartilhado: ajudar as pessoas a se reconectarem com a natureza, e seus próprios corpos.

Reed disse que a ecossexualidade é diferente de outros movimentos sociais porque se foca em comportamentos pessoais e prazer em vez de protestos e política. Ela disse que algumas pessoas dentro do movimento ambiental mantêm distância da ecossexualidade por causa disso. Mas os ecossexuais que entrevistei para esta matéria insistiram que têm um objetivo sério. Como Morgan disse, pensar na Terra como uma amante é o primeiro passo para dar à crise ambiental a seriedade que o assunto merece. “Se você deixa sua mãe puta, ela provavelmente vai te perdoar. Se você destrata sua amante, ela vai terminar com você.”

Ao mesmo tempo, a leveza caracterizada por obras como a casa de banho ou as performances de Sprinkle e Stephens são uma parte integral do movimento. Morgan descreve a ecossexualidade como um meio de contornar “aquela coisa deprimente do Al Gore” que as pessoas geralmente associam ao ambientalismo. A esperança dela, assim como de outros ecossexuais como Weiss e Kronemyer, é que o conceito dê a pessoas comuns uma maneira de se envolver na questão de um jeito acessível e divertido, e criar uma sensação de esperança. Morgan e Weiss também dizem que veem o sexo como uma ferramenta poderosa para motivar as pessoas a fazer do meio ambiente uma prioridade. Como Weiss disse: “Se estivermos fugindo de inundações o tempo todo, não vamos ter tempo para transar”.

Neil McArthur é o diretor do Centre for Professional and Applied Ethics da Universidade de Manitoba, onde o trabalho dele foca na ética sexual e na filosofia da sexualidade. Siga o cara no Twitter.

Tradução: Marina Schnoor

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